segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Saci

O Saci de Ziraldo.
Dia 31 de outubro é conhecido mudialmente como o Dia das Bruxas, mas aqui no Brasil também é o Dia do Saci.

Famoso por aprontar com todo mundo, o Saci é uma entidade fantástica brasileira que tem sua origem em mitos tupi-guarani. Os tupis contavam a história de Matitaperê, um curumim perneta de cabelo-de-fogo que protegia as florestas. Sua função era de guardião das sabedorias e técnicas de preparo e uso de beberagens e medicamentos feitos a partir de ervas medicinais. A ele também era atribuído o domínio das matas e costumava confundir as pessoas que não pediam a ele a autorização para a coleta destas ervas. Já os guaranis falavam de Cambai (ou Cambay), um pequeno "índio" de perna torta (viria daí a expressão "cambaio", que significa manco) com o poder de se tornar invisível, que vivia nos bosques e protegia os animais, escondendo-os dos caçadores.

A ave saci (Tapera naevia)
Alguns crêem que ele ou é filho do Curupira ou um mistura de lendas entre esses seres. Alguns o identificam como um pequeno pássaro de mau agouro que pula numa perna só, o Saci, e seu nome seria uma onomatopéia do pio desta ave. Feiticeiros e pajés se transformam nesse pássaro para se transportarem de um lugar para outro e exercerem suas vinganças.

O píleo.
Os colonizadores portugueses achavam que o Saci era um duende idealizado pelos nativos brasileiros como um apavorante guardião das florestas que perturbava o silêncio da mata com assovios estridentes e encantava crianças e adultos. Carregava um bastão mágico, como uma varinha de condão. Como foi difícil encontrar um nativo brasileiro com cabelos vermelhos, os portugueses acharam que ele na verdade usava um píleo, um chapéu cônico muito usado na Europa ou o barrete frígio, símbolo da liberdade adotado pelos republicanos franceses que lutaram pela queda da Bastilha, em 1789.

Quando os escravos africanos chegaram ao Brasil, a lenda do Saci foi mesclada às histórias sobre os povos Pigmeus. Assim, o Saci tornou-se o negrinho travesso com uma perna só que todos nós conhecemos: vivia fumando cachimbo e usava um gorro vermelho mágico capaz de transformá-lo em um redemoinho de vento. Ele se faz anunciar por um assobio estridente. Ainda é dito que possui orelhas pontudas, olhos alaranjados e mãos furadas.

Suas travessuras favoritas são perseguir viajantes pedindo fumo ou criando armadilhas, esconder objetos domésticos e espantar o gado. Também gosta de montar em cavalos para trançar a crina e o rabo, e surra-los até a exaustão. As galinhas costumam ser suas vitimas: gosta de jogá-las pra cima e chacoalhar os ovos até gorarem. Mas o Saci não atravessa água corrente.


Essas características o fizeram ser sincretizado com o Capeta, dando a ele medo de imagens de santos e rosários. Rezando um credo, a entidade desapareceria numa fumaça vermelha para sempre. Mas o Saci nunca foi uma entidade maldosa, somente brincalhona. Em alguns lugares, como às margens do rio São Francisco, adquiriu duas pernas e a personalidade de um demônio rural que gosta de enganar pessoas. É o famoso Romão ou Romãozinho. Na zona fronteiriça ao Paraguai, ele é um anão loiro do tamanho de um menino de 7 a 8 anos, que gosta de roubar criaturas dos povoados e largá-las em lugar de difícil acesso.

Existem duas formas de se capturar o Saci: pegando seu gorro mágico ou prendendo-o em uma garrafa quando ele está transformado em vento. Essa segunda opção lembra as histórias sobre os gênios arábicos, uma vez que, capturado, o Saci passa a receber ordens de seu dono.

Em 1917, Monteiro Lobato propôs a abertura de um inquérito sobre a existência do Saci-Pererê. Através do jornal O Estado de São Paulo, pediu aos leitores que enviassem cartas contando suas experiências sobre o mito do Saci-Pererê. Esse material rendeu o livro O Sacy-Pererê, resultado de un inquérito. Em 1921, Monteiro Lobato popularizou a lenda ao escrever o livro O Saci, onde Pedrinho consegue capturar o negrinho. Em troca de liberdade, ele leva o menino para uma aventura, onde conhece outros seres míticos brasileiros. O sucesso da publicação transformou o Saci em um personagem de seu Sítio do Pica-pau Amarelo.

Ilustração de José Wasth Rodrigues para a capa do "Inquérito" e nanquim de Monteiro Lobato para o livro "O Saci".

É ainda chamado de Maty, Matin, Matinta-Pereira, Mati-Taperê, Taperê, Yaci-Yaterê e Sá Pereira.

A MANUTENÇÃO DA LENDA
No final dos anos 1990 um grupo de pessoas, preocupadas com a quase extinção do saci, criou a Ancsaci, Associação Nacional dos Criadores de Saci. Sediada em Botucatu (SP), e tendo como patrono Monteiro Lobato, partia do princípio de que cada vez que você conta uma história de saci para uma criança, você está criando um novo saci, e assim ele se perpetua. O movimento se expandiu nos meios acadêmicos, propícios a embates culturais. Em Botucatu, teve Festival Nacional do Saci, que acontece todo mês de agosto. Em outras cidades foram criados núcleos de defesa do folclore, envolvendo educadores, artistas e simpatizantes. Várias escolas, ocupadas pela invasão do Halloween, de origem americana, fizeram ações de recuperação do saci, com bons resultados.

Em 2003 foi fundada a Sosaci – Sociedade dos Observadores de Saci, no município de São Luiz do Paraitinga (SP), que criou o Dia do Saci, sendo seguido por outros, no dia 31 de outubro (data do Halloween) como data de combate aos estrangeirismos, simbolizado pelo simpático perneta.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Um Percy egípcio?

Rick Riordan está uma máquina de fazer livros adolescentes de mitologia! O autor da série de Percy Jackson – que já está na segunda fase – também investiu na mitologia egípcia nas Crônicas dos Kane. A sinopse do primeiro livro, A Pirâmide Vermelha, é:
Desde a morte de sua mãe, Carter e Sadie viveram perto de estranhos. Enquanto Sadie viveu com os avós, em Londres, seu irmão viajava pelo mundo com seu pai, o egiptólogo brilhante, Dr. Julius Kane. Uma noite, o Dr. Kane traz os irmãos juntos para uma experiência de “pesquisa” no Museu Britânico, onde ele espera para acertar as coisas para sua família. Ao contrário, ele liberta o deus egípcio Set, que expulsa-lo ao esquecimento e forças das crianças a fugir para salvar suas vidas. Para detê-lo, os irmãos embarcam em uma perigosa viagem em todo o mundo – uma busca que traz os cada vez mais perto da verdade sobre sua família e seus vínculos com uma ordem secreta que existiu desde o tempo dos faraós.

Apesar da presença de deuses, esse livro parece ter um estilo mais aventureiro, Indiana Jones, Tomb Raider. No entanto, a Editora Intrínseca já lançou o segundo volume – O Trono de Fogo – com uma sinopse que o aproxima dos poderes adolescentes percyanos:
Os deuses do Egito Antigo foram libertados, e desde então os irmãos Carter e Sadie Kane vivem mergulhados em problemas. Descendentes da Casa da Vida, ordem secreta que remonta à época dos faraós, os dois têm poderes especiais, mas ainda não os dominam por completo. Refugiados na Casa do Brooklin, local de aprendizado para novos magos, eles correm contra o tempo. Seu inimigo mais ameaçador, Apófis, está se erguendo, e em poucos dias o mundo terá um final trágico. Para terem alguma chance de derrotar as forças do caos, precisarão da ajuda de , o deus sol. Despertá-lo não será fácil: nenhum mago jamais conseguiu. Carter e Sadie terão de rodar o mundo em busca das três partes do Livro de Rá, para só então começarem a decifrar seus encantamentos. E, é claro, ninguém faz ideia de onde está o deus.

Apófis... Cronos... vai dizer que não encontrou alguma semelhança só de ler as sinopses? Bom... o que importa é que esses livros são uma nova porta de entrada para adolescentes nas histórias mitólogicas, agora as do fascinante Egito. Já andei vendo algums críticas falando que essa série tem uma narrativa bem mais interessante por seu teor aventureiro.

Aproveito para dizer que o segundo filme de Percy Jackson – que será baseado no livro O mar de monstros – já está marcado para março de 2013.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Apsu

Apsu era o deus primevo das águas doces e da Água Celestial da Sabedoria. Suas águas circundavam a terra, enchendo-a com bondade e otimismo. No entanto, a Terra – uma ilha comprida flutuante – era também circundada pelo oceano salgado e amargo da deusa-dragão Tiamat. Apsu fundiu-se, então, a deusa e se tornou seu consorte.

Da mistura fermentada dessas águas, diversos deuses e deusas nasceram, entre eles Anu e Ea, que rapidamente assumiram o controle das ações divinas. Não muito satisfeito com isso, Apsu declarou guerra a esses deuses, mas foi morto por Ea e sepultado no subterrâneo.

Como um ser divindo primordial, Apsu continuou brotando do subterrâneo em forma de fontes de água doce que borbulhavam na superfície da Terra. Diz-se que, da lama gerada por suas águas, o homem foi moldado.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Orixás em quadrinhos

Penetre o universo de Olodunmaré, os caminhos de Omulu, as estratégias de Ogum e a generosidade de Oxóssi. A editora Marco Zero lançou o álbum Orixás - Do Orum ao Ayê, que retrata a criação do mundo segundo a mitologia africana, com o nobre objetivo de difundir uma cultura que tem muitas ligações com a nossa.

Dividida em cinco capítulos recheados de narrativas arrojadas, essa HQ traz ao público histórias que apenas eram partilhadas por quem frequenta os lugares sagrados em que se cultuam os orixás. A arte de Caio Majado conecta o Ayê (o mundo físico) e o Orum (a morada dos deuses), transformando os orixás em meio deuses, meio super-heróis.

Me parece uma bela introdução a este vasto mundo.

sábado, 8 de outubro de 2011

A fúria de Asura

Nem só de mitologia grega vive o mundo dos games... Kratos (da série God of War) deve ganhar um concorrente oriental: Asura's Wrath é o nome do novo jogo da Capcom, que parece se basear na mitologia hindu.

No jogo, o personagem principal é Asura, um deus de seis braços desprovido de seus poderes e traído pelos antigos companheiros, precisa recuperar as antigas habilidades e vingar-se dos demais deuses do Oriente. No entanto, ele não estará sozinho, contando com uma poderosa divindade para auxiliá-lo em sua jornada que vai do passado ao futuro.



Lutar contra deuses de proporções planetárias é meio exagerado, não?

Bom... Asuras eram antideuses na mitologia hindu. Inicialmente, eram poderosos deuses védicos considerados materialistas, pecadores e malignos. Eles disputaram o soma (elixir da imortalidade) com os Devas e perderam. Com o surgimento da dualidade bem/mal, os Asuras foram relacionados a demônios. Em certos casos, Asuras e Devas trabalhavam juntos por um bem comum e, por essa razão, nem sempre eles eram considerados maus, mas um caminho alternativo. Alguns asuras, inclusive, foram incorporados ao panteão hindu, como Varuna e Mitra.

Em alguns aspectos, os asuras poderiam ser relacionados aos Titãs gregos ou os gigantes nórdicos, seres primordiais que abraçavam características mais selvagens. Na tradição semita-cristã, eles poderiam ser caracterizados como anjos caídos.





Máscara artesanal de um asura.

domingo, 2 de outubro de 2011

Para crianças

Saiu hoje no Globinho, uma pequena nota sobre o lançamento do livro Histórias greco-romanas, de Ana Maria Machado com ilustrações de Laurent Cardon (2011, Editora FTD).

Minotauros em ação, rapaz virando flor, tecelã se transformando em aranha, labirintos, palácios... Histórias de amor e muitas aventuras de autores gregos e romanos são recontados por Ana Maria. Tem Hermes, Dédalo e Ícaro, Teseu, Ariadne, Eco, Narciso, Eros, Aracne e muio mais.

É uma ótima forma de introduzir a mitologia no mundo infantil. O livro é recomendado para crianças a partir do 4º ano fundamental (8/9 anos).

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Xipe Totec


Filho de Ometeotl, Xipe Totec era o misterioso deus das plantas, da agricultura, da primavera e das estações do ano, símbolo da morte e do renascimento da Natureza. Dizia-se que ele se esfolava para dar de alimento aos humanos, assim como o milho perde suas casca antes de cair na terra e se tornar uma semente ou como as cobras que trocam de pele.

Estátua de cerâmica
Protetor dos ourives e do ponto cardeal Oeste, foi um dos quatro deuses criadores astecas – junto a seus irmãos Teacatlipoca, Quetzalcoatl e Huitzilopochtli. Por sua aparência sempre cheia de feridas e pele ensanguentada e descascada, alguns acreditavam que ele era o responsável por guerras e doenças (pragas, cegueira, feridas, tumores, bolhas etc.). Mas quando estava com sua pele nova, brilhava como ouro. Frequentemente era representado com listras verticais descendo da testa até o queixo. Carregava um escudo amarelo e um recipiente cheio de sementes.

Era também chamado de Senhor dos Esfolados e Deus das Torturas, porque, em suas festas, as vítimas eram esfoladas vivas e depois sacrificadas. A pela retirada era usada como um casaco pelos sacerdotes por 20 dias até apodrecer e cair, num sinal de vida nova na primavera. Muitos astecas guardavam a pele apodrecida acreditando em suas propriedades curativas.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Deuses numa praça próxima a você!

Recebi esta semana uma matéria que teria saído no jornal O Globo de sábado sobre a arquiteta Vera Dias, referência no patrimônio público quando se fala nos 710 monumentos e chafarizes da cidade do Rio de Janeiro – que ela sabe de cor onde estão todos! Na foto de Marco Ramos (ao lado), vemos a arquiteta com as estátuas de Mercúrio (Hermes), Minerva (Atena) e Marte (Ares), na Praça Noronha Santos, na Cidade Nova.

Imaginem quantos outros não devem estar por aí numa praça próxima a você!

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Medalhas da vitória

Nesta segunda-feira, foi lançada as medalhas dos Jogos Paraolímpicos em Londres 2012. Quem venceu o concurso de criação das medalhas com cerca de 100 designers, foi a chinesa Lin Cheung que teve como inspiração a deusa grega da vitória, Niké – isso mesmo, a da marca esportiva e irmã do Cratos mitológico, não do videogame.


 

Um dos lados da medalha representa o que seria a asa da escultura que está exposta no Bristish Museum (o original da peça, esculpida entre 425 e 421 A.C, fica no Museu Olímpico, na Grécia). O outro lado parece um tecido drapeado.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Vodyanoi

Os vodyanoi são seres (ou espíritos) masculinos hostis que vivem no fundo de lagos. São descritos como rãs do tamanho de focas com face humana ou como homens envelhecidos com barba esverdeada, cabelo comprido e ralo, corpo coberto de limo, algas e escamas negras, patas membranosas no lugar de mãos, cauda de peixe e olhos que queimam como carvões em brasa. Alguns contos chamam os vodyanoi de "povo do mar" ou "povo-peixe". Acredita-se que eles dividiam-se em castas de guerreiros e sacerdotes.

Esses seres também são acusados de serem os responsáveis pela destruição de represas e moinhos d'água. Pescadores, moleiros e apicultores fazem sacrifícios para apaziguá-los, colocando uma pitada de tabaco na água e dizendo "Eis aqui seu tabaco, Senhor Vodyanoi, agora dê-me um peixe".

Eles raramente vêm em terra, mas quando o fazem é para arrastar viajantes incautos para seu palácio de cristal aquático decorado com partes de barcos naufragados. Os humanos ou morriam afogados ou se tornavam seus escravos, passando a respirar debaixo d'água.

Nos contos tchecos, os afogados morrem e o vodník guarda suas almas em potes de porcelana que eles consideram sua riqueza. Caso um pote se abra, a alma escapa em forma de bolhas. Não há menção de uma habitação especial. Seus únicos servos são peixes.

"Vodyanoi" significa "aquático" e, em muitas línguas, é a palavra para o signo de Aquário. Também ser escrito vodnik, wodnik, vadzianik e vodenjak.