segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

HÉRCULES: O fim trágico e a ascensão divina

A morte terrena de Hércules foi extremamente dramática. Novamente livre e purificado de seus atos, o herói decidira erguer um altar em agradecimento a seu pai Zeus. Mandou, então, que o escravo Licas buscasse com Dejanira uma túnica nova que seria usada na consagração solene como praxe. O mensageiro, induzido por Hera, disse que Hércules pedira roupas para seu casamento com Iole e, assim, Dejanira lembrou do conselho de Nesso e enviou uma túnica com a mistura de sangue e sêmen do centauro.

A morte de Hércules. Óleo de Francisco de Zubarán, 1634.

Hércules atira Licas. Estátua de Antonio Canova.
É possível ver as dobras da túnica grudada no herói.
Ao vestir a roupa, o veneno da Hidra penetrou na sua pele e ele tombou em terrível agonia. Alucinado de dor, pegou Licas pelos pés e lançou-o ao mar. Cada tentativa de tirar a túnica, arrancava pedaços de pele, pois o tecido estava grudado em seu corpo. Pediu que fosse levado a Tráquis. Ao ver todo o sofrimento de seu marido, Dejanira se apunhalou de culpa na frente de Hércules que, aos prantos, nada pode fazer. Após entregar Iole a seu filho Hilo, pedindo que com ela se casasse logo tivesse idade para tal, mandou erguer uma pira no Monte Eta para ser cremado. Escalou cambaleante ao seu destino final, porém, ninguém teve coragem de acender a fogueira. Somente o relutante jovem Filoctetes* se disponibilizou e ganhou o arco e as flechas como presente.
* Mestre de armas e amigo pessoal de Hércules, Filoctetes jurou solenemente nunca revelar o paradeiro das cinzas do herói. Foi convidado a navegar até Troia com Menelau para buscar Helena, porém foi deixado por Ulisses em Lemnos por causa de uma ferida infectada no pé, que possui duas versões: em uma, Hera enviou uma serpente para atacá-lo por ter ajudado Hércules; em outra, gregos o forçaram a falar o local das cinzas e, para não quebrar sua palavra, apontou a direção com pé, que foi ferido quando uma das flechas envenenadas da Hidra caiu da aljava.
Hércules na fogueira e Filoctetes aos prantos. Ilustração de E. H. Montagny.
Filoctetes na Ilha de Lemnos. Gravura de James Barry.

Compadecido pelas dores do herói da humanidade, seu pai Zeus assegurou sua imortalidade: em meio às chamas*, ouviu-se um trovão e um raio arrebatou Hércules para o Monte Olimpo, onde foi recebido por Atena. Assumiu seu lugar entre os olimpianos como Deus da Força, desposando Hebe, a deusa da juventude e copeira dos deuses, filha de Zeus e Hera, como acordo final de paz. A deusa rainha passou até mesmo a aceitar o epíteto do bastardo Alcides em seu nome.
* Os poetas mais românticos dizem que o raio de Zeus iluminou toda a Terra e ninfas apagaram as chamas. Da pira surge um Hércules curado que é levado ao Olimpo por Atena e Hermes em um carro puxado por quatro cavalos alados. No entanto, existe uma variante nada poética dessa morte flamejante. Diz-se que o herói teria entrado em combustão em um ataque de Helios a ele. Para extinguir as chamas, lançou-se em um rio caudaloso e acabou se afogando. O rio passou a ter águas quentes, denominando Termópilas (águas termais) a região entre a Tessália e a Fócida.
A morte de Hércules. Gravura de Bernard Picart, 1731.
Casamento de Hércules e Hebe no Monte Olimpo.

A saga de Hércules é a perfeita personificação da ideia grega do pathos, a experiência do sofrimento virtuoso que leva à glória e, no caso do herói, à imortalidade. Era fundamental que sua saga terminasse em fogo, o único elemento simbolicamente capaz de purificá-lo por inteiro. Melpômene, musa da tragédia, passou a carregar a clava de Hércules em razão de toda essa luta. O herói, inclusive, teve um altar em Roma ao lado das musas, colocando-o como um musagete, ou seja, um líder das damas.

Hércules e as musas. Óleo de Alessandro Allori, 1568.

Sua ascensão ao Olimpo é a simbologia para a nomeação da Constelação de Hércules (Herculis, a quinta maior das 88 constelações modernas e uma das 48 constelações clássicas descritas por Ptolomeu), que está a mais de 25 anos-luz de distância da Terra. As representações o colocam segurando seja um ramo com os pomos dourados das Hespérides sejam serpentes que podem ser cabeças da Hidra ou aquelas que ele matou na infância.



PARTE: I - II - III - IV - V
TRABALHO: I - II - III - IV - V - VI - VII - VIII - IX - X - XI - XII
PARTE: VI - VII - VIII - IX - X - XI - XII - XIII - Livro

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Hexa!

Pra não passar em branco, hoje esse blog faz 6 anos! Seja por e-mail ou Facebook, na correria de sempre! Com a Saga de Hércules chegando ao seu fim, devo voltar aos verbetes rápidos por um tempo. Mas vamos que vamos!

HÉRCULES: Uma nova escravidão

O Rei Êurito da Ecália, mestre-arqueiro de Hércules, resolveu desafiar toda a Grécia a vencê-lo numa disputa de arco. O prêmio era sua filha Iole. O herói acabou por fazê-lo, mas o rei não quis que ele desposasse a princesa, porque, pessoalmente, ou por conselho de de seus filhos (exceto Ífito), temesse que Hércules viesse novamente a enlouquecer e matasse Iole. Acabou o próprio rei sendo morto e Iole levada.

Pouco tempo depois, Autólico, filho de Hermes e considerado o maior ladrão da mitologia heroica, roubou o rebanho real da Ecália. Usando de astúcia, pintou os animais para que não fossem reconhecidos e, em Tirinto, vendeu-os a Hércules como se fora o dono. Os filhos do falecido Êurito se convenceram que fora Hércules em vingança que roubara o rebanho e novamente Ífito se colocou contrário, decidindo provar sozinho a inocência do herói. O príncipe seguiu as marcas dos cascos e encontrou Hércules em um estábulo onde, sem acusá-lo, perguntou se ele havia visto o ladrão de gado. O herói disse que seria mais fácil encontrar os animais do que o ladrão e subiram até o alto da muralha de um castelo em Tirinto para ver ao longe. Lá em cima, avistaram o gado da Ecália, mas como estavam de outra cor, Ífito não os reconheceu e se deu por convencido de que Hércules era inocente. Porém, naquele momento, Hera novamente enviou Lyssa e Anoia para enlouquecer o herói e, sentindo-se acuado, jogou Ífito muralha abaixo.

Apolo enfrenta Hércules que rouba a trípode.
Pintura em cerâmica.
Recuperada a razão, procurou novamente o Oráculo de Delfos para se purificar, porém, a pitonisa recusou-se a ajudar um homem que havia matado um inocente de forma covarde. Irado, o herói arrancou a trípode consagrada a Apolo e levou-a embora para fundar seu próprio templo. O próprio deus desceu furioso do Olimpo para enfrentá-lo e recuperar a trípode, mas Zeus interveio com seus raios e acalmou os ânimos. A resposta da pitonisa para o herói mais uma vez o colocou como escravo: devia ser vendido como escravo e o dinheiro de sua venda dado aos irmãos de Ífito como compensação mínima.

Hermes se encarregou de vendê-lo a Ônfale, rainha da Lídia. Por dois anos, Hércules realizou tarefas servis de forma humilde, até que a rainha decidiu dar tarefas heroicas assim como fez Euristeu:

Relevo em Templo de Paestum.
  1. OS CÉRCOPES: Os Cércopes eram Silo e Tribalo, dois altos e fortes salteadores de estrada, filhos da oceânida Teia, que assaltavam e matavam os viajantes. Sua mãe alertava para não cair na mão de um certo “Melampigio” (melampygos, homem de nádegas cobertas por pelos escuros, sinal de força para os antigos gregos). Certa vez, encontraram Hércules dormindo embaixo de uma árvore. Insultaram-no e o atacaram, mas foram facilmente dominados, ficando amarrados com os pés juntos de cabeça para baixo. Começaram a chorar, berrando que Hércules era tal homem de nádegas escuras. O herói se pôs a rir e os libertou com a promessa de não voltarem ao banditismo. Entretanto, o juramento não durou e ambos pilharam e mataram novamente. Só que dessa vez, irritaram Zeus e acabaram transformados em macacos.

  2. SILEU: Filho de Poseidon, Sileu obrigava aqueles que passassem por suas terra a trabalhar até à morte em suas vinícolas. Hércules colocou-se a seu serviço, mas, ao invés de cultivar as videiras, arrancou todas e matou Sileu com um golpe de enxada. Seu irmão, Diceu, hospedou Hércules, que ainda desposou sua filha. Esta mulher se apaixonou de tal forma pelo heroi que, em uma de suas ausências, morreu de amor.

  3. LITIERSES: Assim, como Sileu, Litierses (filho de Midas) era conhecido como Ceifeiro Maldito, uma vez que obrigava todo estrangeiro a debulhar o trigo de suas terra e os decapitava ao final. Hércules novamente se colocou à altura do desafio e matou o gigante vilão. O pastor Dafnis ficou com as terras de Litierses.

  4. OS ITONEUS: Para livrar a Lídia dos Itoneus, Hércules contou com o exército de Ônfale. Em guerra sangrenta, o herói apoderou-se de Itona, cidade dos saqueadores e, após destruí-la, levou os sobreviventes como escravos.

Face a tanta coragem e vitórias gloriosas, Ônfale mandou investigar as origens de seu escravo. Ao saber que era filho de Zeus e da princesa Alcmena, libertou-o e se casou com ele, dando-lhe um filho, Lâmon, ou, segundo outras fontes, dois filhos, Agelau e Tirseno. Após esse período de servidão, Hércules viveu no ócio e na luxúria. Durante este tempo, Ônfale usava a pele do Leão da Nemeia, enquanto o herói trajava suas roupas reais femininas, fiando o linho aos seus pés.

Hércules e Ônfale. Óleo de François Lemoyne, 1724.
Hércules e Ônfale. Óleo de Johann Heinrich Tischbein, 1754.

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sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Brilhe.

É ano chinês do Macaco de Fogo, ano de Oxalá com ajuda de Iemanjá. Ano do Sol e do número 9. Quer saber mais sobre isso, clique AQUI e fique com minha mensagem para 2016:

Em dias nublados, ele está lá. Depois da escuridão, ele aparece.
Portanto, em 2016, não esmoreça. Brilhe.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Gigantomaquia

A queda dos gigantes. Óleo de Francisco Bayeu, 1764. Museu do Prado.

Os Gigantes foram gerados por Gaia (a partir do sangue de Urano que caiu sobre ela após o castramento de Cronos) para vingar os Titãs, que Zeus havia lançado no Tártaro após a Titanomaquia. Eram seres imensos, prodigiosamente fortes, de espessa cabeleira e barba hirsuta, o corpo horrendo, cujas pernas tinham a forma de serpente. Mesmo tendo origem divina, eram mortais, porém só pereciam se fossem atacados simultaneamente por um deus e um mortal.

Tão logo nasceram, começaram a jogar para o céu árvores inflamadas e rochedos imensos. os deuses prepararam-se, então, para o combate. Como Gaia havia produzido uma erva mágica capaz de curar os gigantes (pharmakon), Zeus pediu que Helio, Selene e Eos parassem de brilhar para dificultar a busca pela planta e colheu todas as mudas. O primeiro ataque partiu dos raios de Zeus e da lança de Atena. Porém, sabendo da impossibilidade de matá-los, os deuses convocaram Hércules para auxiliá-los.


Os mitógrafos destacam catorze gigantes neste combate, mas seu número foi bem maior (entre quarenta e mais de cem):
  1. ÁGRIO: Foi criado com Toas para se oporem às Moiras. Acabou morto pelas maças de bronze das três irmãs.

  2. ALCIONEU: Atena aconselhou Hércules a empurrar o poderoso Alcioneu para longe de sua cidade natal, porque ele recobrava as forças por tocar a terra de onde nascera (assim como Anteu). Em seguida, um ataque conjunto dos meio-irmãos, derrubou o gigante que fora criado para se opor a Hades. Seu corpo foi enterrado sob o Monte Vesúvio. Se vencesse os deuses, receberia Ártemis como esposa. Alguns mitógrafos colocam Alcioneu em um encontro anterior com Hércules. Diz-se que o gigante teria tentado roubar do herói o rebanho de Gerião. Outros dizem que o gigante começou a guerra ao atacar Helio e levar seu gado solar.

  3. Hécate contra Clítio. Detalhe do Altar de Pergamo.
  4. CLÍTIO: Criado para drenar a energia de Hécate, terminou massacrado pela deusa com golpes de tocha.

  5. EFIALTES: Esse gigante afugentou Ares, mas foi morto por um flecha de Apolo no olho esquerdo uma de Hércules no olhos direito.

  6. Fonte de Encélado. Versailles, França.
  7. ENCÉLADO: Era o menor e mais fraco dos gigantes, porém o mais inteligente. Usava três lanças e deveria governar o mar e desposar Atena se a vitória fosse sua. Chegou a ser queimado por Dioniso e eletrocutado por Zeus, mas nada o derrubava, até que enfrentou a própria Atena. Ao ver que não seria capaz de vencer seu nêmese, tentou fugir, mas a deusa jogou sobre ele a ilha de Sicília, aprisionando-o. Diz-se que, enterrado sob a ilha, o Encélado ainda se contorce e estremece causando terremotos.

  8. ÊURITO: Foi empalado pelo tirso de Dioniso com ajuda de seus sátiros.

  9. GRÁTION: Opunha-se a Selene e terminou flechado por Ártemis e Hércules.

  10. HIPÓLITO: Foi apunhalado por seu nêmese Hermes, que usava o capacete de invisibilidade de Hades.

  11. PALAS: Foi esfolado por Atena que se serviu da pele do gigante como armadura (possivelmente daí vem o epíteto Palas Atena). O resto de seu corpo foi transformado em pedra pela cabeça da medusa presa no escudo da deusa.

  12. PERIBEIA: Giganta criada para derrotar Afrodite, mas a deusa desferiu um golpe mortal com seu espelho.

  13. Poseidon ataca Polibotes com seu tridente
    e a ilha no ombro. Pintura em cerâmica.
  14. POLIBOTES: Após ser acertado por um raio de Zeus, Polibotes correu para a ilha de Kós. Poseidon atirou seu tridente mas errou o alvo, cortando um pedaço da ilha. O deus continuou perseguindo o gigante criado para se opor a ele, até pegar o pedaço da ilha e esmagá-lo (nascendo a ilha de Nísiro).

  15. PORFÍRIO: Criado como um rei entre seus pares para se opor a Zeus, desposaria Hebe se vencesse os deuses. No entanto, Porfírio atacou Hera, uma vez que Zeus causou-lhe desejo ardente pela deusa. Enquanto rasgava-lhe as vestes para estuprá-la, Zeus o fulminou com um raio ao mesmo tempo que Hércules disparava suas flechas envenenadas. Nem mesmo essa ajuda fez com que Hera desistisse de perseguir o herói: pelo contrário, a deusa se sentiu humilhada e fortaleceu seu desejo de vingança.

  16. MIMAS: Criado para se opor a Hefesto foi queimado com uma saraivada de ferro em brasa. Alguns mitógrafos dizem que foi incinerado por um raio de Zeus, e outros dizem que foi morto por Ares ou até mesmo Afrodite. Foi enterrado na Prócida.

  17. TOAS (TOON): Foi criado com Ágrio para se oporem às Moiras. Acabou morto pelas maças de bronze das três irmãs.
Hermes ainda derrubou quatro gigantes e Hefesto, dois. Sete outros que cercaram Afrodite foram mortos por Hércules. Percebendo que a derrota era iminente por causa da presença do herói, dez gigantes atiraram-se em sua direção, mas foram todos mortos pelos raios de Zeus combinados às flechas de Hércules. A Gigantomaquia é o ápice da glória de Hércules no imaginário dos homens, que transformou o herói mortal no salvador de deuses.