sexta-feira, 15 de abril de 2016

HÉRCULES: Arte hercúlea

Por ser talvez o heroi da mitologia clássica mais conhecido universalmente, Hércules é um dos que teve mais sorte entre os artistas desde a Antiguidade. Seus trabalhos, assim como outras lendas ligadas ao herói, são figurados já desde o começo do séc. VII a.C., quando surge na cerâmica grega a técnica da decoração em negro. As divindades e os herois eram representados em figuras negras e contornos entalhados contra o fundo alaranjado da argila, em composições inspiradas em obras pictóricas (madeira e afrescos) que se perderam, mas cuja existência é atestada por fontes literárias. Entre os muitos exemplos, destacam-se uma ânfora ática do século VI a.C. com a Disputa pela Corça da Cerineia entre Héracles, Apolo e Ártemis, sob o olhar de Atena (Museu do Vaticano) e duas ânforas do início do século V a.C. (Museu do Louvre) que mostram Hércules golpeando a Hidra de Lerna com um machado e Hércules luta contra as aves estinfálidas. Nestes dois exemplos, são bem visíveis os atributos tradicionais do heroi: a pele do Leão da Nemeia e a clava. Às vezes, o semideus também é representado com uma espada (presente de Hermes) ou com arco e flechas (dados por Apolo).

Na segunda metade do século VI a.C., aparecem também os primeiros vasos com decoração invertida, ou seja, de figuras vermelhas que tem contornos negros no interior e se recortam sobre fundo negro. Durante cerca de um século os ceramistas usaram essa técnica não só para realizar o escorço das figuras, mas também mostram a profundidade espacial e a expressão psicológica dos personagens. Entre os exemplos mais importantes desse estilo aplicado à figura de Hércules, está vaso de grandes dimensões (cratera em cálice) de c. 510 a.C., do ceramista Eufrônio, com a representação da luta entre Hércules e Anteu, e o vaso de boca larga (canjirão) com a cena de O jovem Hércules estrangulando as serpentes, de c. 480 a.C.


Também são muitas as representações do heroi na estatuária antiga. Entre os exemplos mais interessantes, há dois: o Hércules Lansdowne e o Hércules de Farnese, ambos do século IV a.C. Não faltam os exemplos de mosaicos greco-romanos ou de arte etrusca que tem como tema as gestas dele.

A figura de Hércules se mantém como um tema preferido pelos artistas e pelos respectivos clientes até os primeiros séculos da era cristã, para depois desaparecer do horizonte artístico, junto com outros temas mitológicos, no decorrer dos séculos seguintes. Uma de suas representações tardias na arte antiga é a da pintura parietal (mural) do século I d.C. proveniente de Herculano, com Hércules estrangulando as serpentes.

Outros herois e deuses da mitologia clássica reapareceram na arte durante o século XV, no Renascimento italiano. Já então visto como encarnação do bem que triunfa sobre o mal, segundo a interpretação neoplatônica da lenda, Hércules se torna mais uma vez um assunto popular, destinado a perdurar. O escultor e pintor Antonio del Pollaiolo foi um dos primeiros a utilizar temas exclusivamente mitológicos. Por volta de 1460 pintou, a pedido de Lourenço o Magnífico, três grandes telas sobre os trabalhos de Hércules, que infelizmente se perderam. Duas madeirinhas de Pollaiolo com Hércules e a Hidra e Hércules e Anteu (Galleria degli Uffizi) são consideradas evocações dessas obras. Nelas, já não vemos o linearismo* e a bicromia das representações dos vasos antigos, mas uma restituição clássica da anatomia unida às poderosas figuras masculinas da estatuária antiga, que estava sendo redescoberta no decorrer do século XV pelos artistas humanistas. As cenas são impregnadas de energia, graças as nervosas linhas de contorno que compõe a figura de Hércules e as dos seus adversários. Em Hércules e a Hidra, a pele de leão se infla com o enérgico salto do heroi para a frente e a ponta do manto descreve uma curva, assim como os longos pescoços da Hidra e sua cauda que se enrola a uma perna de Hércules. Além disso, as cenas não se recortam mais sobre o fundo monocromático, abstrato, mas sobre um paisagem a perder de vista, conquista da pintura flamenga e dos estudos sobre a perspectiva.
* Linearismo se baseia na consistência mais expressiva e física da linha de cor e do chiaoscuro para uma definição mais clara e limpa da forma às custas da sensação de profundidade. Essa tendência artística se desenvolveu por volta do século XV e teve em Botticelli um de seus expoentes.
O mesmo Pollaiolo representa Hércules e Anteu num pequeno bronze de c. 1475. Vicenzo de Rossi, escultor florentino do século XVI, dá sua versão do tema num grupo escultórico que hoje se encontra no Palazzo Vecchio, em Florença; em 1599, Giambologna realiza o grupo marmóreo com Hércules e o centauro Nesso. Alguns anos mais tarde, Rubens pinta Héracles estrangulando o leão da Nemeia (várias versões) e Héracles no jardim das Hespérides (Galleria Sabauda, Turim); o pintor espanhol Francisco de Zurbarán fornece suas versões para os trabalhos de Hércules em telas (veja aqui sua tela de Hércules e Cérbero).

Mais tarde, nos primeiros anos neoclássicos do século XIX, o escultor Antonio Canova explorou o tema da cólera de Héracles executando um grupo escultórico de grande dramaticidade, no qual mostra o herói arremessando no ar seu amigo Licas (veja aqui). Uma versão entre o fantástico e o fantasmagórico de um episódio da vida do herói nos é dada por Héracles e a Hidra de Lerna, de Gustave Moreau. Seria errôneo, contudo, atribuir a popularidade do heroi entre os artistas exclusivamente ao aspecto simbólico do bem que triunfa sobre o mal. Talvez, mais do que qualquer outra coisa, os artistas sejam atraídos pelo caráter dramático e exasperado de suas aventuras.



PARTE: I - II - III - IV - V
TRABALHO: I - II - III - IV - V - VI - VII - VIII - IX - X - XI - XII
PARTE: VI - VII - VIII - IX - X - XI - XII - XIII - Livro

quarta-feira, 13 de abril de 2016

Ask e Embla

O primeiro homem, criado pelos deuses de uma árvore em cinzas, e a primeira mulher, criada de uma árvore de olmo, feitos pelos três criadores no litoral do mar gigante de Midgard. Odin deu vida ao casal. Vili lhes deu pensamentos e sentimentos e Ve deu-lhes a capacidade de ver e ouvir. Ask e Embla geraram a raça humana e Midgard tornou-se sua morada.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Tonatiuh

No antigo mito centro-americano dos Cinco Sóis (as cinco eras mundiais), Tonatiuh representava a Quinta Era. Esse deus governava o mundo de Tonatiuhican, o céu asteca, um paraíso espiritual reservado apenas aos mais dignos, como os guerreiros mortos em batalhas e as mulheres que morriam ao dar à luz.

Como deus do oriente e do sol, seu poder era constantemente desafiado pela luta enfrentada em seu nascimento diário, com sua passagem pelos céus durante o dia e sua morte à noite. Feroz e belicoso, Tonatiuh era também uma divindade guerreira que fortalecia os soldados no calor e nos esforços das batalhas.

As esferas de influência de Tonatiuh indicavam que seu poder sofria ameaças constantes. A humanidade só poderia mantê-lo se exercitasse a virtude de elevada moral – junto com um ciclo interminável de sacrifícios humanos. Os apetites do deus estão graficamente representados em suas imagens. Seu corpo, no centro de um grande disco solar cheio de raios, é vermelho, e ele usa um cocar de penas de águia. Sua língua tem a forma da faca sacrifical que os sacerdotes astecas usavam para arrancar o coração das vítimas vivas – oferenda que as presas gigantes de Tonatiuh seguram firmemente. A violência deste deus era tão grande que os astecas atribuíram seu nome ao mais cruel dos conquistadores espanhóis, Pedro de Alvarado.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Brigantia

Como deusa celta da vitória, Brigantia (Briganta, Brigindo) era apropriadamente a protetora dos brigantes, tribo do norte da Bretanha que habitava o local hoje conhecido como West Yorkshire, poderosa o bastante para resistir às forças do Império Romano por mais de 150 anos. Parece ter sido associado por Júlio César a “Minerva Celta” – uma das divindades locais que ele descreveu após invadir a Bretanha em 55 a.C. Certamente a deusa corresponde à romana Minerva, tanto no seu aspecto guerreiro quanto no seu papel de protetora das artes e do artefato: uma estátua do século III mostra Brigantia segurando a lança de Minerva e um globo que simboliza o governo, com suas asas da vitória aparecendo por trás dos seus ombros. Séculos mais tarde, pode ter sido também o modelo para Britânia, a guerreira que usava capacete e carregava um tridente, personificando o Império Britânico.

Embora os brigantes fossem mais tarde subjugados pelos legionários romanos, que marcharam para o norte para construir o Muro de Adriano no século II, sua divindade ainda era reverenciada durante a ocupação romana da Bretanha como uma deusa ninfa das fontes. Pode também corresponder à irlandesa Brígida, à qual se atribuíam a cura e a medicina, protegia muitas fontes, cujas águas possivelmente curavam os enfermos.

terça-feira, 5 de abril de 2016

Welsit Manatu

O criador do povo lenape é Welsit Manatu ("espírito bom"). Ele fez tudo o que há no mundo: criou a Terra do barro, formou os humanos e plantou ervas úteis para o povo comer e usar como remédio. Também ajudou as pessoas matando ou transformando seres nocivos. Por exemplo, reduziu o enorme esquilo que comia gente a um tamanho pequeno. Seu trabalho é desfeito pelo cruel Mahtantu, que criou plantas venenosas e morcegos.

sábado, 2 de abril de 2016

Cagn

Um dos heróis do povo san (os bosquímanos do Deserto do Kalahari) era o ardiloso louva-a-deus Cagn. Transformando-se numa grande variedade de animais, podia inclusive fazer suas sandálias virarem dois cães ferozes, que atacavam os inimigos. Quando Cagn era morto sob a forma animal, seus ossos podiam ser consertados e ele voltava à vida.

quarta-feira, 23 de março de 2016

Mamma mia!

Você deve estar se perguntando o quê o filme Mamma mia! (2008) está fazendo num blog de mitologia...

Bom... Eu poderia dar um resposta simples e direta do tipo "o blog é meu e eu escrevo o que eu quiser (principalmente se for sobre Meryl Streep)"... e até meio que é isso... mas, por incrível que pareça, esse musical tem duas citações mitológicas, além de ser filmado na belíssima ilha grega de Escópelos:
  1. No início do filme, Sophie (Amanda Seyfried) fala sobre uma lenda da Fonte de Afrodite: quem bebesse de sua água acharia o amor verdadeiro e a felicidade perfeita. Acredita-se que essa fonte está no Chipre.
  2. E no fim, no fim mesmo, os deuses olimpianos aparecem e se divertem ao som de Waterloo.


O musical é ótimo e divertido. Vale muito pelas músicas do ABBA, mesmo que algumas canções tenham sido assassinadas pelos intérpretes. Fique, então, com The winner takes it all, onde Meryl Streep fala de amor e bota a culpa nos deuses. E, conhecendo a mitologia grega... eles tinham culpa mesmo!

sábado, 19 de março de 2016

Ossanha protege o Jardim Botânico do Rio

No meio da cidade do Rio de Janeiro tem um paraíso chamado Jardim Botânico. E ele é protegido por Ossanha, orixá do verde, belamente representado nessa estátua em resina de 5 metros de altura do artista plástico baiano Tatti Moreno (2004).

terça-feira, 15 de março de 2016

Heróis do Olimpo - O filho de Netuno

Há três anos li e resenhei o livro O herói perdido, primeiro da segunda saga de Percy Jackson e cia. Retomei a saga e já terminei o segundo livro - O filho de Netuno - que irei comentar agora.

Lembrando... no primeiro livro, Percy estava desaparecido, três novos semideuses foram apresentados junto à uma nova profecia e os deuses agora aparecem em suas versões romanas. Como eu havia dito, a premissa é a mesma da primeira saga, tendo Gigantomaquia como nova base e a grande vilã é Gaia.

Esse segundo livro acontece ao mesmo tempo que o primeiro, mas nesse ficamos sabendo o motivo da ausência de Percy. Fica difícil de entrar em mais detalhes sem dar spoiler, mas em determinado momento você se sente meio enganado... do tipo já li isso antes... A questão é que o interessante deixa de ser a saga em si, mas cada novo personagem que conhecemos. Talvez esse seja o grande talento de Rick Riordan: saber escrever os perfis e enredos de cada um que aparece e ir apresentando isso em doses homeopáticas. É isso que faz a gente ir lendo, lendo, lendo, até um final que não é final nenhum... afinal é só o segundo de cinco livros.

Dessa vez o autor mergulha na Morte... não só na sua personificação mitológica Tanatos, mas também no Reino Inferior e seu deus, Hades/Plutão. Novos gigantes são mencionados e o lado militarizado do Império Romano torna-se imprescindível.

Ter a Mãe-Natureza como inimiga pode ser um interessante questionamento, mas é preciso ver aonde isso tudo vai chegar.

sábado, 12 de março de 2016

Minotaura

Já tivemos uma Centaura, por que não uma Minotaura também?

Óleo sobra madeira da espanhola surrealista Remedios Varo (1959).

Essa obra está na exposição Frida Khalo - Conexões entre mulheres surrealistas no México, que fica até 27 de março na Caixa Cultural do Rio de Janeiro.