sábado, 13 de dezembro de 2025

Khepri


O deus Khepri (Kheper, Khepera, Khepra, Khepre, Khepere) criou-se a partir da matéria primordial ao dizer seu próprio nome, em seguida ele procriou os deuses Shu e Téfnis, formando a primeira trindade. De Shu e Téfnis nasceram Geb e Nut.

Foi associado ao escaravelho porque os antigos egípcios acreditavam que esses besouros eram auto-criados a partir de matéria morta. Essa crença surgiu devido ao fato dos escaravelhos fêmea depositarem seus ovos no esterco e nos corpos mortos de vários animais – incluindo de outros escaravelhos. Quando esses ovos eclodiam, davam a entender que escaravelhos surgiam da morte. Por isso, Khepri é representado por um escaravelho ou um homem com cabeça de escaravelho, segurando o cetro was e o ankh. O símbolo do escaravelho em egípcio antigo significa “tornar-se”.


Quando o culto ao deus-Sol Ra alcançou relevância, Khepri foi identificado como uma variante dele: Ra seria o sol de meio-dia e Khepri, o sol nascente, aquele que empurra o sol através do céu durante o dia e durante a noite, em sua passagem pelo Duat (submundo), assim como o escaravelho que rola bolas de esterco. Nessa associação com o ciclo diário do amanhecer, Khepri simbolizava a renovação proferida pelo movimento de nascimento, morte e renascimento (ressurreição ou reencarnação), e podia ser representado como um escaravelho numa barca solar. Quando o culto a Amon se unificou a Ra, Khepri passou a ser uma manifestação do jovem Ra.



Nenhum templo ou culto especificamente dedicado a Khepri foi descoberto até hoje, mas acredita-se que a maioria dos templos egípcios (possivelmente todos) tinham uma estátua de Khepri dentro deles. O amuleto em forma de escaravelho era um dos símbolos mais populares do Egito. Os escaravelhos destinados aos mortos eram confeccionados com muito realismo, em pedra dura e colocados no lugar do coração, no peito das múmias, às vezes, incrustados numa moldura retangular. Estes amuletos já foram encontrados até no peito de certos animais tidos como sagrados pelo povo egípcio.

No RPG Pathfinder, Khepri é um deus da liberdade e do trabalho árduo. Já nas Crônicas de Kane, de Rick Riordan, Khepri aparece como uma das três formas (escaravelho) que Ra escolhe para se dividir e dormir. Também aparece como personagem em jogos como Smite e Cassette Beasts, com poderes relacionados à proteção e ao movimento.

quarta-feira, 19 de novembro de 2025

O mito de Osíris

O mito de Osíris é um dos mais importantes e influentes da religiosidade do Antigo Egito. Ele articula temas essenciais para o pensamento egípcio: a vida que vence a morte, a ordem que vence o caos, a legitimidade do poder real, a fertilidade da terra, a esperança na vida após a morte. Osíris não é apenas um deus morto; ele é um deus que renasce eternamente, assim como o Nilo que transborda e fertiliza o Egito.

Osíris era um dos grandes deuses da Enéade de Heliópolis*. Filho de Geb (a Terra) e Nut (o Céu), ele governava o Egito como um rei justo e sábio. Era o rei civilizador que ensinou aos humanos a agricultura, o cultivo da videira, a criação das leis e os rituais religiosos, símbolo da ordem, fertilidade e renovação.

  • Uma enéade era um agrupamento de nove divindades ligadas entre si por laços familiares. A palavra enéade é de origem grega; em egípcio usa-se a palavra Pesedjete.

Era irmão de Set (deus do caos, da violência e do deserto), Néftis (senhora da casa) e Ísis (deusa da magia e da maternidade). Osíris se casou com Ísis, enquanto Set se casou com Néftis.

Set sentia inveja do prestígio de Osíris. Isso se tornou rancor quando descobriu que sua esposa havia ficado grávida do irmão. Néftis sentia-se negligenciada por seu marido, associado à infertilidade. Ela desejava a fertilidade e a luz de Osíris. Néftis então se disfarçou de Ísis, usando perfumes, roupas e magia para enganar o deus. Dessa união nasceu Anúbis, que viria a se tornar deus dos mortos, da mumificação e da proteção dos túmulos.

Enquanto Ísis entendeu a traição conjugal de Néftis com compaixão e até vê Anúbis como filho*, Set viu sua incapacidade como esposo e figura viril evidenciada, aumentando a rivalidade polarizada com seu irmão (ordem vs. caos, fértil vs. infértil). Além disso, o filho gerado poderia ser interpretado como um herdeiro mais legítimo que qualquer possível filho de Set, ameaçando diretamente sua posição no panteão e entre os vivos.

  • Ísis era devotada, estratégica, sábia: ela sempre agia visando restaurar o cosmos. O adultério não foi apresentado como uma crise conjugal, e sim como uma peça no grande drama de morte e renascimento. Então, ela não reagiu com ciúmes humanos, pois compreendeu que sua irmã sofria com o abandono de Set. Inclusive, Ísis tem Anúbis como um filho, que passa a servi-la e protege o corpo de Osíris, tornando-se o deus mais fiel à ordem funerária. Ísis, Néftis e Anúbis formam uma tríade dos ritos funerários: Ísis fica ao pé do sarcófago, Néftis fica à cabeceira e Anúbis preside o embalsamamento.

O primeiro ataque

Set elaborou, então, um plano para subjugar seu irmão: construiu um belo cofre exatamente do tamanho do corpo de Osíris (o primeiro sarcófago) e, durante uma festa, prometeu presentear quem coubesse perfeitamente nele; quando Osíris deitou no cofre, Set e seus conspiradores fecharam a tampa, selaram-na com chumbo e jogaram o cofre no Nilo. Set determinou, assim, o fim da ordem e o início do caos.

O cofre flutuou pela correnteza, atravessou pântanos e canais, seguiu até o mar e encalhou na costa da Fenícia (Líbano atual). Encostado em uma árvore (um tamarisco ou um sicômoro), acabou tendo a madeira crescendo ao redor: o sarcófago passou a fazer parte da árvore.

O rei da cidade de Byblos, sabendo da beleza do tronco, mandou derrubar a árvore para usá-la como coluna do palácio. O corpo de Osíris passou a sustentar metaforicamente o palácio de um rei estrangeiro, e o reino misteriosamente começou a prosperar.

Ísis começou, então, uma jornada mágica e diplomática. Ela chegou à cidade sem revelar quem é. Ela se instalou perto de uma fonte – em versões, sob a forma de simples viajante, criada ou mulher silenciosa de semblante nobre. As criadas da rainha de Byblos a encontraram, encantaram-se com sua dignidade e a levaram ao palácio para se tornar a ama de um dos príncipes. Certa noite, Ísis colocou o bebê nas chamas para queimar sua mortalidade e foi surpreendida pela rainha, que gritou e interrompeu a magia. Nesse momento, a deusa revelou sua natureza e todo o palácio percebeu que estava hospedando uma divindade.

Ísis disse, então, ao rei e à rainha: “Eu busco o corpo de meu marido. O que vocês chamam de coluna é meu tesouro.” Desesperado por ter tocado algo sagrado, o rei entregou a coluna imediatamente. A deusa retirou o sarcófago de Osíris da coluna e o abraçou. Entoou os primeiros lamentos sagrados (manjeres) e, em seguida, abriu a tampa do cofre para ungir o corpo, perfumá-lo com leite de tamarisco (símbolo de renascimento) e envolvê-lo com linho. Ísis levou o corpo escondido em um barco para o Egito e o ocultou em território sagrado, nas ilhas pantanosas do Delta.

O segundo ataque

O problema é que Set caçava na região e reconheceu o corpo recuperado de Osíris. Furioso,desmembrou-o em várias partes – para evitar a ressurreição –, espalhando-os pelos nomos* (províncias) do Egito.

  • Apesar de haverem textos e iconografias que aumentam o número de partes em que Set desmembrou o corpo de Osíris (até 42 nomos, inserindo as vísceras), o mais tradicional é afirmar que foram 14 partes por estar ligado às fases da lua (14 dias de lua crescente e 14 dias de lua minguante): cabeça, braço direito, braço esquerdo, mão direita, mão esquerda, peito/coração, coluna (djed), abdômen, pênis (que não foi encontrado e, por isso, não são 15 partes), nádegas, perna direita, perna esquerda, pé direito e pé esquerdo. O ciclo lunar foi associado à morte e ao renascimento de Osíris.

Para os egípcios, Ísis era a única capaz de recompor um corpo morto, acordar a força vital (ka), ativar magia com palavras verdadeiras (heka) e gerar vida a partir da morte. Então, tomada pelo luto, Ísis partiu sozinha em busca dos fragmentos de seu marido. Ela vestiu roupas de viajante, cortou o cabelo, abandonou seu status de rainha e adotou o papel da viúva peregrina divina. Navegou pelo Nilo num pequeno barco de papiro (eram considerados protegidos contra crocodilos, que não atacavam por respeito à deusa). Ela consultou serpentes, crocodilos, pássaros, espíritos do Nilo, e até crianças (que eram consideradas puras e capazes de ver o invisível).

A tradição varia, mas muitas fontes colocam a cidade de Abydos como o primeiro local onde Ísis encontrou um pedaço de Osíris: o coração, o centro da vida e o início da restauração da ordem. Cada vez que Ísis encontrava um pedaço, ela chorava por ele (e o Nilo inundava), purificava-o, envolvia-o em linho, realizava pequenos rituais funerários, e seguia adiante.

Cada cidade que guardava um fragmento (uma relíquia sagrada) erguia um santuário para Osíris (“túmulos de Osíris”). Assim, o corpo de Osíris tornou-se um mapa de todo o Egito e criou uma geografia sagrada: cada parte do corpo, um nomo, um ponto de poder ritual.

Ressurreição mágica e fálica

A única parte que Ísis não encontrou foi o pênis de Osíris, que teria sido engolido por um peixe (oxirrinco, lepidoto ou fagrus, dependendo da versão) ou se perdeu nas águas primordiais do Nilo. Comer o tal peixe chegou a ser proibido em várias partes do Egito, pois seria ingerir simbolicamente a energia sexual divina, profanar o princípio da fertilidade e se apropriar do que não pertence aos humanos.*

  • No Egito, o poder sexual divino não é visto como luxúria, mas como força vital e princípio de continuidade do cosmos. Então, o falo de Osíris não é apenas uma parte do corpo perdida: é um eixo simbólico que une morte, fertilidade, sexualidade ritual, poder criador e a própria ordem do cosmos. Enquanto os outros fragmentos do corpo foram distribuídos pelos nomos, o falo “saiu da terra”, não está em templo nenhum (não há reivindicação territorial de posse), não pode ser possuído por sacerdotes (não há monopólio de poder), não é encontrado por nenhuma divindade. Ele é o ausente, o irredutível, a parte que não retorna ao mundo material, e isso não é falha, é excesso. Isso transforma o falo de Osíris em um mistério, não um objeto. O falo é invisível porque é onipresente, não localizado, cósmico. Ele não poderia, dentro do mito, existir como simples órgão. O falo perdido também tinha uma leitura agrícola, pois ele se torna a semente dispersa pelo Nilo, que fertiliza tudo. Osíris é o grão que morre e renasce, já que seu corpo foi semeado pela terra do Egito. Ele torna Osíris mais do que um morto recomposto: ele se torna a própria força geradora que permeia o Nilo, a terra e as plantas. Assim como o Nilo fertiliza o Egito, Osíris fertiliza a terra com sua própria morte e renascimento.

Quando Ísis encontrou o último fragmento (normalmente a cabeça ou os pés, dependendo da tradição), ela retornou ao local onde havia reunido todos os fragmentos encontrados para realizar um ritual de ressurreição que culminou na primeira mumificação da história. Com a ajuda de Néftis, Anúbis (como filho adotado) e Thot (deus da palavra), Ísis desembrulhou os fragmentos, purificou-os e perfumou-os novamente (embalsamamento), e reintegrou-os ao corpo, embrulhando-os em novas faixas de linho.

Mas sem o pênis, faltava o ponto que permitiria dar continuidade à linhagem e restaurar a ordem cósmica, o eixo criador que faz a vida atravessar a morte. Fontes egípcias descrevem a reconstrução do falo de forma velada, mas consistente. Primeiro, Ísis insuflou o sopro da vida, ou seja, atraíu o ka de Osíris de volta ao corpo, não para reanimar o cadáver, mas para despertar seu poder criador: em alguns textos, ela é chamada de “Aquela que faz o ka se erguer.” Em seguida, a deusa nomeou o falo usando palavras mágicas (hekas) e isso criou seu princípio. Um trecho comum nos hinos diz: “O que Ísis nomeia, toma forma.”, pois no Egito a palavra não descreve, ela faz existir.

Alguns textos falam de uma modelagem simbólica, onde Ísis teria moldado um falo feito de ouro (incorruptibilidade e eternidade), cera ou lama do Nilo, dependendo da tradição. Em textos tardios, ele é chamado de “falo dourado”, “o membro criado pela magia”, “o pilar da vida”. Porém, ele é entendido mais como um princípio de criação do que como um peça anatômica.

Concepção divina

Por fim, Ísis se transformou em um milhafre* (falcão feminino) e planou sobre o corpo de Osíris, batendo as asas sobre ele até pousar em seu peito. Esse movimento simboliza a união ritual e a fecundação divina, pois, nesse momento aconteceu a transferência da potência criadora de Osíris para Ísis e, assim, a deusa fica grávida. Os textos dizem: “Ela recebeu a semente do deus.”, “O vento da vida passou para dentro dela”, mas através de um processo mágico-cosmogônico e não biológico. A iconografia nunca mostra o ato, justamente por não se tratar de sexualidade humana: não foi um ato sexual, mas litúrgico e cósmico.

  • No Egito antigo, milhafre era a ave da maternidade e do luto, pois vocalizaria sons semelhantes a lamentos humanos.

No Egito, a sexualidade divina é simbólica e não biológica, pois os deuses não estavam presos às limitações físicas humanas. O poder sexual divino não era visto como luxúria, mas como força vital e princípio de continuidade do cosmos. Então, o falo de Osíris não era apenas uma parte do corpo perdida ou um instrumento de prazer e reprodução biológica: era um eixo simbólico que une morte, fertilidade, sexualidade ritual, poder criador e a própria ordem do cosmos. Enquanto os outros fragmentos do corpo foram distribuídos pelos nomos, o falo “saiu da terra”, não estava em templo nenhum (não há reivindicação territorial de posse), não podia ser possuído por sacerdotes (não há monopólio de poder), não foi encontrado por nenhuma divindade. Ele é o ausente, o irredutível, a parte que não retorna ao mundo material. Isso transforma o falo de Osíris em um mistério, não um objeto. O falo é invisível porque é onipresente, não localizado, cósmico. Ele não poderia, dentro do mito, existir como simples órgão.

Osíris voltou à vida, mas não retornou à Terra: ele se tornou o Senhor do Duat (o mundo dos mortos), o Juiz das almas, símbolo de ressurreição, fertilidade e ciclo da natureza. Osíris é o grão que morre e renasce, já que seu corpo foi espalhado pelo Egito. O gesto de Isis de recriar o falo é, simbolicamente, a germinação, a fecundação da terra pela água do Nilo, o retorno da vida após a inundação. Assim como o Nilo fertiliza o Egito, Osíris fertiliza a terra com sua própria morte e renascimento. Então, o falo perdido transforma Osíris em mais do que um morto recomposto: ele é a semente dispersa pelo Egito, a própria força geradora que permeia o Nilo, a terra e as plantas.

Hórus, o herdeiro da ordem cósmica, surgiu da concepção divina, com cabeça de falcão. O deus cresceu escondido para escapar do ódio de Set. Ao atingir a idade adulta, lutou contra o tio para reclamar o trono de seu pai. Após uma longa série de combates e julgamentos divinos, Hórus venceu. Assim, o faraó vivo passou a ser identificado com Hórus, e o faraó morto, com Osíris.

domingo, 16 de novembro de 2025

Príapo

O deus conhecido por seu enorme pênis tem a paternidade questionada. Dizem que era filho de Afrodite com Zeus, Hermes, Adônis ou (por isso, ele é representado muitas vezes como um sátiro), ou de Dionísio com uma náiade. Porém, o mais comum é indicá-lo como filho de Afrodite com Dionísio.

Diz-se que Afrodite cedeu aos abraços de Dionísio, mas durante a expedição do deus à Índia, tornou-se infiel e viveu com Adônis. No retorno vitorioso de suas batalhas, Dionísio foi recebido ardorosamente por Afrodite, que logo o abandonou novamente. Ela foi para Lâmpsaco, no Helesponto, para dar à luz. Hera, insatisfeita com a conduta da deusa (e vingativa pela derrota no julgamento de Páris), deu um soco no ventre da deusa (outros dizem que ela lançou uma maldição) e fez com que a criança nascesse com extrema feiúra e genitais incomumente grandes, sendo visto como uma deformidade*. Com medo de que seu filho e ela própria fossem ridicularizados pelos deuses, Afrodite abandonou-o numa alta montanha, onde foi encontrado e criado por ninfas e pastores.

* Vale lembrar que na sociedade grega, pênis pequenos eram usados nas estátuas para representar controle dos instintos e civilidade, enquanto, pênis grandes e eretos representavam descontrole emocional e animalidade.

Durante seus anos de formação, entrou em contato com o grupo fervoroso de Pã, um bando de sátiros e ninfas conhecidos por seu comportamento animalesco e exibicionismo sexual descarado. Por conta de sua libertinagem e desregramento, tornou-se objeto de terror e repulsa na cidade de Lâmpsaco. A região foi tomada por uma epidemia e os habitantes viram nisso uma retaliação por não terem dado atenção ao filho de Afrodite. Fizeram rituais (dizem que virgens sentaram em falos gigantes de pedra) e pediram que ele ficasse entre eles.

Himeneu disfarçado de mulher durante um ritual a Príapo (óleo sobre tela de Nicolas Poussin, 1638).

Mesmo sem ter tido filhos e estudiosos dizerem que ele era infértil por conta de sua condição física, há motivos para crer que ele era considerado o promotor da fertilidade tanto da vegetação quanto de todos os animais ligados à vida agrícola. Era venerado como protetor dos rebanhos de ovelhas e cabras, das abelhas, dos vinhedos, de toda a produção hortícola e até mesmo da pesca. Como outras divindades que presidiam as atividades agrícolas, acreditava-se que ele possuía poderes proféticos, sendo por vezes mencionado no plural.

No entanto, Príapo não era considerado uma divindade importante na Grécia até tempos muito tardios – durante o período macedônico, por volta do século 4 a 2 a.C. Os primeiros poetas gregos, como Homero, Hesíodo e outros, por exemplo, não mencionam essa divindade. Estrabão afirma expressamente que foi apenas em tempos posteriores que ele foi honrado com culto divino, e que era adorado na região onde teria nascido, sendo chamado de Helespontíaco.

Ovídio escreveu sobre o quase estupro de Vesta (Héstia) pelo lascivo Príapo. A deusa teria caído em um sono profundo após um banquete no Monte Ida oferecido por Cibele. O deus a atacou, mas um jumento começou a zurrar sem parar e o espantou. O episódio fez com ele passasse a odiar os jumentos, amaldiçoando-os com sua natureza lasciva que permaneceria nesses animais.

Outra lenda conta que Príapo se apaixonou por Lótis, uma ninfa, filha de Poseidon. Desesperada com os cortejos do deus que considerava um monstro libidinoso, implorou aos deuses por ajuda e acabou transformada em uma árvore.

Por mais que Príapo desejasse e tentasse, nunca conseguia satisfazer seus desejos. Até que um dia, sua ereção não cedeu e ele não conseguia andar com seu pênis tão grande endurecido. Pã o carregou e o colocou na entrada da floresta como uma espécie de guardião. Sempre que visitantes indesejados passavam por ali, Príapo levantava sua túnica, mostrava seu membro e os espantava.

Por essa razão, estátuas de Príapo tornaram-se muito populares para guardar portões, propriedades, encruzilhadas e pomares. Era esculpido, principalmente, na forma de hermas (bustos sobre um pilar quadrado de pedra), com genitais eretos muito grandes (usualmente em relevo), carregando frutas em sua vestimenta, usando uma coroa de folhas de vinha (ou louro) e uma foice ou cornucópia na mão. Acreditava-se que os transeuntes deveriam “acariciar o pênis” para dar sorte. Sobre o monumento colocavam também cabeças animais (inclusive de jumentos) que os habitantes lhe ofereciam em sacrifício, assim como mel, leite, bolos e frutas.

Lendas áticas associam Príapo a seres sensuais e obscenos – conhecidos como Conisalo (“o lascivo”), Orthanes (“o ereto”) e Ticonde (“o produtor”, “o frutificador”) – que caminhavam pela corte de Afrodite.

As hermas de Príapo na Itália eram geralmente pintadas de vermelho (cinábrio ou zarcão), razão pela qual o deus é chamado de Ruber ou Rubicundus. Também foi confundido pelos italianos com Mutunus (Tutunus ou Mutinus/Tutinus), o falo que personificava o poder frutificador na natureza e o mais poderoso repelente de demônios e de todo o mal resultante do orgulho e da arrogância. Um Mutunus público, isto é, um falo marcado na parede, afastava o mal da cidade de Roma e da república. Tinha um santuário na parte alta de Velia, que existiu até a época de Augusto, quando foi transferido para fora da cidade. Foi muito popular em Pompeia, onde existia a crença “goze enquanto pode, pois a vida é muita curta” e, portanto, vivia a sexualidade de forma livre e natural.

Curiosidades

Priapismo é uma condição médica geralmente dolorosa e potencialmente danosa na qual o pênis ereto não retorna ao seu estado flácido, apesar da ausência de estimulação física e psicológica. A ereção dura em média 4 horas, e pode levar à impotência sexual definitiva. É uma emergência médica e o recomendando é procurar atendimento de emergência prontamente.

Priapeia é uma coleção de 95 poemas latinos sobre assuntos referentes ao Príapo. Foram compilados por um editor desconhecido a partir de obras literárias e inscrições nas esculturas do deus (epigramas)

Vários gestos manuais que representavam o ato sexual foram associados à sorte e ao afugentar o mau olhado por conta de Príapo, como, por exemplo, cruzar os dedos (sobrepor os dedo médio sobre o dedo indicador), dar uma banana (segurar o bíceps e flexionar o braço com o punho fechado), fazer a figa (colocar o polegar entre os dedos) e levantar o dedo médio (símbolo fálico) ou mesmo o polegar (símbolo de positivo). Depois que a Igreja Católica foi aceita no Império Romano, começaram os tabus e o puritanismo a respeito da sexualidade humana.

No entanto, desde 1979, em Montreal, Canadá, existe o Templo do Príapo Sagrado, com seguidores que acreditam que o falo é a fonte da vida, da beleza, da alegria e do prazer. Os rituais envolvem masturbação e sexo entre homens.

terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Panetone


A origem do panetone mais famosa remete a uma lenda típica da época natalina:

Na véspera de Natal do ano 900, na Itália, um humilde assistente de padeiro chamado Toni trabalhava horas a fio para cumprir suas tarefas e conseguir folga no dia seguinte para cuidar de sua mãe doente. Já tarde da noite, seu chefe mandou que preparasse uma fornada de pães e a torta de Natal para servir à sua família e seus convidados. Devido à exaustão, acabou derrubando as uvas passas da torta do seu chefe na vasilha onde descasava a massa de pão. Numa tentativa desesperada de reverter a situação, ele  misturou os outros ingredientes da torta (frutas cristalizadas, manteiga, ovos, leite e açúcar) na mesma massa do pão. Assou a mistura e deixou na mesa para seu chefe castigá-lo somente no dia seguinte. Logo de manhã, o chefe já o esperava na porta. Ao contrário do que imaginava, o padeiro se encantou pela "invenção" e a batizou de "Pane di Toni" (Pão de Toni). E a nova receita fez tanto sucesso que Toni se tornou sócio da padaria.

Existe uma versão mais "romântica" dessa história:

No fim do século 15, o jovem padeiro Toni trabalhava na padaria Della Grazia, em Milão. Apaixonado pela filha do patrão, teria inventado o pão doce para impressionar o pai de sua amada. Os fregueses passaram a pedir o "Pani de Toni", que evoluiu para o panattón (vocábulo milanês), e depois para panettone (italiano para "pãozinho grande").

E, claro, como não podia deixar de ser, Ludovico Sforza (1452-1508) – também conhecido como Ludovico, il Mouro, patrono de Da Vinci e duque de Milão entre 1494 e 1499 – se apropriou da criação do panetone:

Diz-se que, na véspera do Natal de 1945, a sobremesa que havia sido preparada para o grande banquete natalino queimou ao ser assada. Um dos empregados da cozinha, chamado Antonio, havia preparado uma massa fermentada com sobras de ingredientes, que pretendia levar para sua casa. Ofereceu, então, sua massa para servir como sobremesa para a corte. Ludovico apreciou tanto a iguaria que precisava saber o nome daquele pão com frutas. Antonio disse que a sobremesa não tinha nome e Ludovico resolveu chamá-la de "Pani de Toni".

Porém, professores de História da Alimentação da Universidade de Bolonha, na Itália, garantem: apesar de poéticas, nenhuma dessas lendas é verdadeira. Segundo Massimo Montanari, o panetone é uma receita de tradição coletiva e, portanto, não se pode determinar com precisão absoluta seu lugar e data de nascimento. É possível rastrear seu ancestral romano do século 3: um grande pão redondo com frutas (naturais, não secas ou cristalizadas) que simbolizava o sol e era usado em celebrações sazonais. Sabe-se que famílias se reuniam ao redor desse pão doce especial, antes de levá-lo ao forno, e faziam uma cruz no topo para representar as quatro estações e pedir fartura. Depois que o Império Romano se tornou cristão, a cruz no pão deu a conotação natalina que manteve a tradição. Passas e frutas secas teriam entrado na receita somente no início do século 19 e, em 1919, o empresário italiano Angelo Motta industrializou a produção de panetone, incluindo a famosa fita de papel manteiga ao redor da massa que se tornou uma marca registrada e mudou o formato do panetone de achatado para cilíndrico.


Apesar dessa construção coletiva e secular, hoje a receita clássica de panetone é uma só e está protegida por um decreto assinado em 2005 na Itália, que determina as quantidades mínimas de cada ingrediente que devem ser usadas na confecção desse pão!

O panetone foi trazido para o Brasil por imigrantes italianos no século 19. Mas sua popularização só aconteceu mesmo a partir de 1948, quando Carlo Bauducco, dono da Bauducco, começou a vender em São Paulo. Como não podia ser diferente, aqui as coisas se misturaram e surgiram os chocotones e os panetones salgados. O chocotone, aliás, também é uma invenção da família Bauducco: foi o neto mais velho de Carlo, que, em 1978, sugeriu a troca das frutas por chocolate. Apesar de reticentes em alterar uma receita tradicional, o rapaz convenceu seus familiares. Hoje, o Brasil é o segundo maior produtor de panetones no mundo (perdendo apenas para a Itália) e terceiro maior consumidor (atrás de Itália e Peru).


Obs: Existe também o pandoro, ou "pão de ouro", que é um bolo veneziano de massa amanteigada porém sem frutas cristalizadas. Seu formato é bem característico: um cone com base de estrela de 8 pontas, parecendo uma árvore de Natal. A receita foi registrada no escritório de patentes em 1894 pelo padeiro de Verona, Domenico Melegatti.

quarta-feira, 17 de agosto de 2022

Entre o sonho e o mito

 "O sonho é uma experiência pessoal daquele profundo, escuro fundamento que dá suporte às nossas vidas conscientes, e o mito é o sonho da sociedade. O mito é o sonho público, e o sonho é o mito privado."

Joseph Campbell em O poder do mito.

Sonho causado pelo voo de uma abelha ao redor de uma romã um segundo antes de acordar
óleo sobre tela de Salvador Dalí, 1944.

Leia sobre a corte grega dos sonhos AQUI.

quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Urano

Urano (ou Ouranos, em grego, "o que cobre" ou "o que envolve") era a divindade grega que personificava o céu estrelado. Os gregos imaginavam o céu como uma cúpula sólida de bronze, decorada com estrelas, cujas bordas desciam para repousar sobre os limites mais externos da terra plana.

Era considerado, pela maioria, um deus primordial, a primeira divindade a assumir o controle do universo, sem ascendência. Porém, alguns estudiosos dizem que ele descendia de Éter (ar) e Hemera (dia), enquanto, segundo os hinos órficos, Urano era filho da noite, Nix.

Na Teogonia de Hesíodo, Urano emergiu (ou se desprendeu) de Gaia, a Terra, de modo assexuado e imediatamente a recobriu com seu manto estrelado em toda a sua extensão, tornando-se então seu consorte (algumas leituras, o colocam como estuprador). A partir dessa união entre o céu e a terra, o mundo começou efetivamente a tomar forma. Junto a Gaia, então, Urano é o ancestral da maioria dos deuses gregos.

O céu a terra eram uma só forma;
e quando se separaram um do outro, em dois,
criaram todas as coisas e levaram-nas à luz:
árvores, aves, animais, seres que o mar alimenta
e a raça dos mortais.
(Eurípedes)

Teve vários filhos (ou irmãos, se considerarmos Gaia sua esposa-mãe): primeiro, geraram criaturas poderosas, selvagens e incontroláveis, que obedeciam apenas sua própria natureza, dentre os quais os três ciclopes (Brontes, o trovão; Estérope, o relâmpago; e Arges, o raio), os três hecatônquiros (Coto, Briaréu e Gigues, gigantes de cem braços e cinquenta cabeças); e, posteriormente, os menos selvagens, mas igualmente poderosos Titãs e Titânides, em seis pares.

Todavia, ele detestava as poderosas “crianças” geradas – e temia ser destronado por elas. À medida que nasciam, mantinha-os aprisionados nas entranhas da Terra (o Tártaro), sem ver a luz, e se deliciava com essa crueldade. Isso causou não só um impasse na criação do mundo como também uma grande dor em Gaia, que, então, começou a conspirar contra o marido/filho, instigando seus filhos a se rebelarem contra o pai. Com o ferro (ou sílex) mais resistente de suas entranhas, Gaia forjou uma afiada foice (instrumento sagrado que cortas as sementes, e semente em grego é spérma, “esperma”) e ofereceu a Cronos, filho mais novo, titã destemido e de pensamentos tortuosos. Armado da inquebrável foice, Cronos se escondeu e, à noite, quando Urano recobriu Gaia, decepou os órgãos sexuais do pai com um só golpe, lançando-os ao mar.

Rápida [Gaia] criou o gênero do grisalho aço,
forjou grande podão e indicou aos filhos.
Disse com ousadia, ofendida no coração:
“Filhos meus e do pai estólido, se quiserdes
ter-me fé, puniremos o maligno ultraje de vosso
pai, pois ele tramou antes obras indignas”.
Assim falou e a todos reteve o terror, ninguém
vozeou. Ousado o grande Crono de curvo pensar
devolveu logo as palavras à mãe cuidadosa:
“Mãe, isto eu prometo e cumprirei
a obra, porque nefando não me importa o nosso
pai, pois ele tramou antes obras indignas”.
Assim falou. Exultou nas entranhas Terra prodigiosa,
colocou-o oculto em tocaia, pôs-lhe nas mãos
a foice dentada e inculcou-lhe todo o ardil.
Veio com a noite o grande Céu, ao redor da Terra
desejando amor sobrepairou e estendeu-se
a tudo. Da tocaia o filho alcançou com a mão
esquerda, com a destra pegou a prodigiosa foice
longa e dentada. E do pai o pênis
ceifou com ímpeto e lançou-o a esmo para trás.
(Hesíodo)

A Mutilação de Urano por Saturno, de Giorgio Vasari e Gherardi Christofano (século XVI)
Releitura medieval da emasculação de Urano.

Porém, a potência criadora de Urano era tamanha que do seu sangue que caiu sobre Gaia (terra), nasceram os gigantes, as Erínias, as ninfas Melíades e segundo alguns, os telquines; e a partir da genitália lançada ao mar (em alguns casos, só os testículos, em outros, somente gotas de sêmen), nasceu Afrodite. Alguns dizem que a fabulosa tribo dos feácios nasceu da foice ensanguentada que ou se tornou a ilha de Corfu ou foi enterrada na costa oeste do Chipre, em um local chamado Drepanum (foice).

Cronos libertou, a seguir, todos os irmãos presos no interior da terra e se tornou governante dos deuses. Urano continuou a cobrir Gaia diariamente, mas, impotente, tornou-se uma divindade ociosa, sustentada pelo titã Atlas – não sem antes amaldiçoar (ou seria, profetizar?) seu algoz que ele seria destronado por um filho assim como ele havia sido.

* Grato a Zeus que o vingou, Urano o advertiu que o filho que ele teria de Métis o destronaria. Por isso, Zeus a engoliu, o que resultou no nascimento de Atena.

Algumas lendas, dizem que Cronos teve a ajuda de seus irmãos Jápeto, Hipérion, Ceos e Crios. Eles se posicionaram cada um em um dos quatro cantos da terra e seguraram um membro de Urano enquanto Cronos o emasculava. Cada irmão levou um membro do pai para governar um canto da terra: Jápeto foi para o oeste, Hipérion para o leste, Ceos para o sul e Crios para o norte.

Interessante dizer que Urano foi raramente considerado como antropomórfico – à parte a genitália do mito da emasculação. Em expressões arcaicas dos poemas homéricos, o termo para céu se confunde com o termo para Olimpo, a morada dos deuses. Do ponto de vista simbólico, Urano traduz uma proliferação criadora desmedida e indiferenciada, cuja abundância acaba por destruir o que foi gerado.

Aeon e Gaia em mosaico de villa romana em Sentinum.
Sem culto ou imagem na arte grega primitiva (podia ser representado por um touro celestial branco ou até mesmo azul), Urano foi frequentemente descrito pelos romanos como Aeon, o deus do tempo eterno, ou Caelus, o céu. Na Mesopotâmia, seria An ou Anu. As representações egípcias de Nut (deusa do céu) e Geb (deus da terra) lembram muito a ideia concebida de Urano e Gaia. É o sétimo planeta do sistema solar.

sábado, 4 de janeiro de 2020

10!

E hoje esse blog faz 10 anos, mesmo depois de um 2019 arrastado e realmente cheio de lutas como previsto (somente 5 postagens no ano passado).

2020 é ano de configurações planetárias raras que sugerem mudanças globais. Apesar de ter muitas luas cheias e efeitos lunares, 2020 é ano do Sol.

Quanto mais estruturados estiverem os projetos, melhor (a numerologia 4 indica isso). Quem trabalha duro e plantou sementes nos últimos tempos, deve começar a colher alguns frutos. Isso vale tanto para o positivo quanto para o negativo, pendendo para a justiça (o orixá Xangô e o Imperador do tarô incia isso). Assim, ansiedade e estresse devem continuar como os grandes maus da humanidade.

O Ano do Rato de Metal começa em 25 de janeiro e promete motivar o empreendedorismo em um período de busca por conhecimento e uso da inteligência para a abertura de novos caminhos e soluções práticas. A cor do ano é verde, mas a Pantone decidiu pelo Azul Clássico.

Muito do silêncio aqui neste blog foi exatamente por causa de estruturação de novos projetos e busca de conhecimento. Vamos ver o esse ano solar nos reserva!

domingo, 27 de outubro de 2019

Diwali


Diwali (Deepavali ou Deepawali, "fila de lâmpadas" em sânscrito) é uma festa religiosa hindu, conhecida também como o Festival das Luzes. É celebrado uma vez ao ano no Hinduísmo, no Sikhismo, no Budismo e no Jainismo, em outubro ou novembro, dependendo do calendário lunar.

O evento dura cinco dias, tendo seu auge no terceiro dia - a lua nova (amavasya), o dia mais escuro - quando velas e lamparinas à óleo (diyas) são acesas como uma representação da vitória da luz sobre as trevas, do conhecimento sobre a ignorância, do bem sobre o mal dentro de nós, fazendo uma alusão a diversas histórias, entre elas:
  • A vitória de Rama, um dos avatares de Vishnu, sobre Ravana, o mal encarnado que havia raptado sua esposa Sitadevi. Após anos de exílio, eles retornam ao lar, pois o povo do Reino de Ayodhya acendeu lamparinas para iluminar o caminho.
  • A destruição de Narakasura por Krishna.
  • O nirvana de Mahavira (ocorrido em 15 de outubro de 527 a.C.) no Jainismo.
  • O retorno do iluminado Guru Hargobind Ji (1595-1644) à cidade de Amritsar após sua libertação como preso político pelo imperador. Para os sikhis, essa data é também conhecida como Bandi Chhorh Divas, o "Dia da Libertação dos Detidos".
Historiadores acreditam que essa data também está associada aos festivais que celebravam o fim da colheita de verão e os preparativos para o outono.

Apesar de ser um feriado extremamente religioso de muita introspecção e votos de sacrifício, as pessoas estreiam roupas novas, dividem doces (mithai) e presentes e lançam fogos de artifício para celebrar. Acredita-se que a deusa Lakshmi, da riqueza e da prosperidade, visita e abençoa as casas limpas e bem iluminadas e, por isso, muitas edificações mantém todas as luzes internas acesas e muitas vezes fazem uma decoração externa com luzes.

Celebração com fogos na Índia em 2013.

Jogatina é encorajada nessa época como uma forma de atrair boa sorte ao longo do ano. É uma lembrança dos jogos de dados que Shiva e Parvati realizavam no Monte Kailasa, bem como as disputas entre Radha e Krishna. Em honra a Lakshmi, as mulheres sempre deveriam ganhar.

domingo, 12 de maio de 2019

Dia das Mães

A mais antiga comemoração do Dia das Mães é mitológica. Na Grécia antiga e – posteriormente – em toda a Ásia Menor, a entrada da primavera em março era festejada em honra de Réa (Cibele para os romanos), a Mãe dos Deuses.

Ann Mary Reeves Jarvis
Hoje o Dia das Mães é uma celebração em família, mas em sua história está um velório nos EUA.

Em 1858, a ativista e filantropa Anna Jarvis havia organizado clubes de mães (chamados de Mother's Day Work Clubs, ou Clubes do Trabalho Diurno das Mães) para lutar por melhorias de condições sanitárias em que viviam as crianças pobres de famílias trabalhadoras, e depois para ajudar soldados e órfãos da Guerra Civil. Em 1868, Jarvis criou o Mother's Friendship Day (Dia da Amizade das Mães), para unir mães e veteranos numa celebração da paz. Outras ativistas propuseram outras datas, como o Mother's Day For Peace (Dia das Mães Para a Paz) em 1872. O sentido dessas datas eram as mães se unindo para celebrar alguma coisa, não sendo celebradas.

A filantropa faleceu em 1905 e sua filha, Anna, tentou tornar essa data um feriado nacional, porém, foi recebida com escárnio: os congressistas diziam que teriam que criar "Dia da Sogra" se aceitassem a proposta. Durante o memorial de três anos de morte da filantropa, um culto celebrando todas as mães deu a partida para que data fosse oficializada. No entanto, somente em 1914, a data foi oficializada nos EUA pelo então presidente, Woodrow Wilson, para todo segundo domingo de maio: dia 9 de maio de 1914 é considerado o primeiro Dia das Mães.

Dos EUA, a celebração passou para o resto do mundo, nem todos comemorando na mesma data: na Noruega, por exemplo, é no segundo domingo de fevereiro, e em Portugal, no primeiro domingo de maio, quando a Igreja Católica celebra o Mês de Maria, mãe de Jesus. Em alguns países, a data é fixa: 8 de março na Rússia; 21 de março no Egito, na Síria e em outros países árabes; 7 de abril na Grécia, 10 de maio no México e na Índia; 15 de maio no Paraguai; 26 de maio na Polônia; 15 de agosto na Bélgica e na Costa Rica. Aqui no Brasil, a primeira comemoração se deu em 1918, em Porto Alegre. A data foi oficializada por Getúlio Vargas em 1932, nos moldes estadunidenses e, em 1947, entrou para o calendário católico brasileiro.

Na década de 1920, Anna Jarvis ficou incomodada com a comercialização do feriado. Ela criou a Associação Internacional para o Dia das Mães, alegou direitos autorais sobre o segundo domingo de maio, e chegou a ser presa por perturbar a paz. Ela e sua irmã Ellsinore gastaram a herança da família fazendo campanha contra o feriado. As duas morreram na pobreza e sem filhos. Segundo o obituário de Anna no New York Times, ela dizia que "um cartão impresso não que dizer nada além de que você é preguiçoso demais para escrever para a mulher que fez mais por você que qualquer outra pessoa no mundo. E tortas! Você leva uma para sua mãe e então come tudo você mesmo. Um belo sentimento!". Hoje o Dia das Mães é considerada a segunda melhor data comercial, perdendo somente para o Natal.

Seja celebrando todas as mães, seja celebrando as mães espirituais, seja celebrando só a sua mãe, o importante é que a maternidade seja entendida como fator imprescindível para a vida.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Camisinha

A mitologia grega apresentou a ideia da camisinha ao mundo. O rei Minos, filho de Zeus e Europa, era conhecido por suas inúmeras amantes. Por obra de sua esposa Pasífae, Minos passou a ejacular serpentes, escorpiões e lacraias, que matavam todas aquelas que se deitassem com o soberano. Somente ela era imune ao feitiço, mas este tornou o rei incapaz de ter filhos. Minos, no entanto, se apaixonou por Procris. Para evitar que a relação com Minos lhe trouxesse a morte, Procris introduziu em sua vagina uma bexiga de cabra, onde os seres venenosos ficaram aprisionados.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Nove!

Nove anos em 2019! Inacreditável!

E o ano de 2019 será de lutas intensas já que Marte, deus greco-romano da guerra, é o planeta regente a partir de 20 de março (até essa data, ainda teremos o Júpiter de 2018 enchendo o nosso saco). Com isso, Ogum é o orixá do próximo ano. Sincretizado à São Jorge, ele rege 2019 para tirar o povo da catarse e levá-lo à luta. Para os chineses, 5 de fevereiro marca o início do Ano do Porco da Terra. Por marcar o fim do ciclo dos doze signos do horóscopo chinês, 2019 está sendo considerado um bom ano para todos os outros animais do zodíaco.

Aos trancos e barrancos, mas sempre em frente!

De onde viemos? Para onde vamos?

Comecei o ano com essas duas perguntas através do livro Origem (Ed. Arqueiro, 2017), de Dan Brown, que agora busca desafiar a igreja (como sempre) com a evolução tecnológica num suspense pelas ruas de Madri e Barcelona. A fórmula se mantém (tornando tudo meio óbvio), mas dessa vez com menos arte e mais arquitetura, menos códigos e mais ansiedade para saber qual afinal são as respostas para as perguntas.

Passamos quase o livro todo querendo pular para o final, com a certeza de que não vamos perder nada se o fizermos. Infelizmente, Dan Brown ainda vive das reviravoltas d'O Código da Vinci, o que nos faz ler tudo, aguardando por alguma coisa. Só que essa coisa não vem... E quando vem a hora das respostas, você já vai estar tão ansioso que não é o suficiente.

Bom... a resposta "de onde viemos?" é dada parcialmente e até tem uma estrutura interessante que realmente dá uma bela pancada em todos os preceitos mitológicos/religiosos. Porém, a fagulha divina ainda está lá. Já a segunda resposta... Ficou de um jeito meio inventado, forçado, tipo "era isso? Um livro inteiro pra isso?". E isso, é claro, dá uma derrubada no livro.

Porém...

Fiz a pausa dramática porque cada vez que o autor abordava a situação histórico-política-religiosa da Espanha, me senti sendo transportado para o Brasil de agora. E uma frase de Edmund Burke se tornou para mim mais importante do que as duas perguntas: "Aqueles que não conhecem a história estão fadadas a repeti-la". #ficaadica

segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

domingo, 23 de dezembro de 2018

Mnemósine

Mneme era uma das musas titânicas, "aquela que recorda", nascida do movimento das águas. Sua nascente no Hades era conhecida como ter o poder de fazer não só recuperar e preservar a memória como também alcançar a onisciência. Foi ela que lembrou Zeus de quem ele era, de suas origens e o ajudou a compreender a importância de resgatar e unir seus irmãos para lutar contra a tirania de seu pai Cronos.

Após a derrota dos titãs, Zeus tomou Mneme como sua primeira amante durante nove noites e a transformou na deusa da memória, Mnemósine. Dessa relação, nasceram as nove musas clássicas. Mnemósine morava com suas filhas no Museion.

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Oiá / Iansã

Ilustração de Carybé
Na mitologia nigeriana Yorubá, o nome Oiá (Oyá) provém do rio de mesmo nome – atualmente chamado de rio Níger –, onde seu culto é realizado. Filha de Aganju e Iemanjá, é tanto uma divindade das águas como sua mãe e Oxum, quanto do ar, sendo uma das que controla os ventos.

Assim como a deusa Obá, Oiá também está relacionada ao culto dos mortos, onde recebeu de Xangô a incumbência de guiá-los a um dos nove céus de acordo com suas ações, para assumir tal cargo recebeu do feiticeiro Oxóssi uma espécie de erukê* especial chamado de Eruexim, com o qual estaria protegida dos eguns (maus espíritos).

O nome Iansã (Inhansã) trata-se de um título que Oiá recebeu de Xangô, seu marido. Faz referência ao entardecer, "a mãe do céu rosado" ou "a mãe do entardecer". Era como ele a chamava, pois dizia que ela era radiante como o entardecer. Costuma ser reverenciada antes de Xangô, como o vento personificado que precede a tempestade. Na saudação, pedem clemência para que ela apazigue o deus das tempestades. Entre os orixás femininos é uma das mais imponentes e guerreiras, sendo associada à forte sensualidade.

Os devotos costumam lhe oferecer sua comida favorita, o àkàrà (acarajé), ekuru e abará. No candomblé as cores utilizadas para representá-la são o rosa e o marrom. No Brasil, foi sincretizada à Santa Bárbara e sua comemoração é no dia 4 de dezembro. Já na Santeria cubana, está associada à imagens de Nossa Senhora da Candelária, Nossa Senhora da Anunciação e Santa Teresa.

* Apetrechos da cultura afro-brasileira confeccionados com cauda de boi, de búfalo ou de cavalo, com as finalidades de afastar os maus espíritos, eliminar as adversidades da comunidade e atrair a fartura e prosperidade. Na África, nobres os usam como símbolos de status e para espantar moscas.

domingo, 2 de dezembro de 2018

Árvore de Natal


Uma das tradições mais famosas do Natal é a árvore cheia de enfeites que se torna elemento principal na decoração e ponto de referência para as famílias e os presentes. Entretanto, não existe apenas um registro e não se sabe ao certo qual a data exata de seu aparecimento, mas algumas histórias merecem ser citadas.

Conta-se que era comum pendurar ramos verdes em portas e janelas para afastar maus espíritos e doenças (algo parecido com o que ainda fazemos com as guirlandas natalinas), uma vez que as árvores e plantas que permaneciam verdes e saudáveis durante os invernos mais rigorosos tinham um significado especial. Já os antigos romanos também usavam ramos e galhos para a decoração do festival dedicado a Saturno, o deus da agricultura, e atrair fartura nas plantações.

Outra versão acredita que o alemão Martinho Lutero, monge protestante do século XVI, foi quem deu início à decoração de pinheiros com luzes dentro de casa. Dizem que, em uma noite de inverno, enquanto ele caminhava, viu estrelas brilhando entre as árvores e relacionou com a presença de Jesus Cristo. Em casa, resolveu reproduzir a cena e usou velas em um pinheiro. Porém, a história que popularizou o adorno aconteceu em 1846, na Grã-Bretanha: uma imagem da família real, com a influente Rainha Victoria, e o príncipe alemão, Albert, foi publicada no Illustrated London News e viralizou tanto por lá, quanto nos Estados Unidos também (ao lado).

Os pisca-piscas coloridos como conhecemos só deram o ar da graça em 1917, quando Albert Sadacca, um jovem de Nova York, resolveu criar as luzes elétricas e coloridas após a explosão de uma árvore com luzes de velas. Este foi o início da empresa NOMA Electric Company, a maior empresa fabricante de luzes de Natal há anos.

A data certa para montar, segundo a tradição cristã, é no início do Advento – tempo de preparação para o nascimento de Jesus Cristo – que é de quatro domingos antes do Natal. O desmonte da árvore e seus enfeites no dia 6 de janeiro, o Dia de Reis, que representa o encontro dos Reis Magos com o Menino Jesus.

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Día de Los Muertos

A única certeza que todos os homens e mitologias sempre dividiram é a Morte. Causadora de tantos medos, ela é encarada de forma bem diferente dependendo da sua localização geográfica. Em muitos países, é motivo de choro e luto demorado. Em outros, os doentes e idosos fazem de tudo para morrer em determinado lugar. E existem os países que encaram a morte de frente. E com festa!


Día de Los Muertos comemora as vidas dos ancestrais, que nessa época voltam do outro mundo para visitar os vivos. Os povos indígenas mesoamericanos – há relatos da celebração em povos náuatles (astecas), maias, tarascanos e totonacas há, no mínimo, três mil anos – tinham cerca de um mês inteiro dedicado aos mortos: o nono do calendário asteca, equivalente ao nosso agosto. Na era pré-hispânica era comum a prática de conservar os crânios como troféus, e mostrá-los durante os rituais que celebravam a morte e o renascimento. As festividades eram presididas pela deusa Mictecacihuatl, a Dama de la Muerte, esposa de Mictlantecuhtli, senhor do reino dos mortos.

Quando os espanhóis chegaram naquelas terras, se assustaram com esses costumes e logo trataram de cristianizar a celebração, que teve a data alterada para coincidir com o Dia de Finados católico. A festa como conhecemos é recente: em 1960, o governo criou um feriado nacional, incluiu a festa no currículo escolar e passou a incentivá-la como um ícone da identidade mexicana forma do pelo sincretismo religioso, que mistura Virgem Maria, crucifixos e vários elementos da crença asteca. Sua singularidade e importância cultural a fez ser reconhecida pela UNESCO, em novembro de 2003, como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade.

Segundo a crença popular, neste dia os mortos têm permissão divina para visitar seus parentes vivos. As ruas e as casas são enfeitadas com flores, velas e incensos. As tumbas são decoradas e os vivos levam oferendas aos mortos. As famílias preparam verdadeiros banquetes, as pessoas se enfeitam de fantasias e máscaras (a maioria como caveiras coloridas) e as crianças se divertem. Nos cemitérios. De noite. E com os mortos.


Entre oferendas e decorações, um arco de flores simboliza a passagem usada pelos espíritos. Algumas famílias têm o costume de abrir os túmulos e retirar os mortos para limpar os restos mortais deles. Depois colocam os mortos nas tumbas para mais um ano de descanso, claro.

Um dos símbolos mais tradicionais da festa é a caveira decorada, conhecida como La Catrina. O nome vem de uma gravura do artista José Guadalupe Posada, que mostra a caveira de uma mulher da alta sociedade, vestindo um enorme chapéu decorado com flores. A ideia é mostrar que mesmo tendo status e riqueza em vida, somos todos iguais após a morte.


Caveiras coloridas aparecem na decoração, nas fantasias, nas maquiagens e até mesmo em forma de doce, feita de açúcar. Essa guloseima é um presente para mortos e vivos, mas não é a única comida típica da época. Vale também levar a comida que o morto gostava, brinquedos para crianças e tequila para os adultos, tudo para animar a celebração. A festa tem até cronograma organizando a chegada dos antepassados: entre 31 de outubro e 1º de novembro, os mexicanos celebram as almas que morreram quando crianças, no Día de los Angelitos, ou Dia dos Anjinhos; já o dia seguinte é dedicado a quem foi para o outro mundo durante a vida adulta.

A festa dos mortos afeta vários aspectos da sociedade mexicana. Os jornais ficam cheios de charges e quadrinhos de esqueletos. E também são comuns as peças de teatro que contam a história de Don Juan Tenorio, drama escrito pelo espanhol José Zorrilla y Moral, mas que aparece de várias formas na cultura latina. Don Juan é um sujeito que vive para seduzir mulheres e lutar com homens.

Recentemente a animação Coco (A vida é uma festa, no Brasil), da Disney/Pixar apresentou diversas características desta celebração familiar.

PELO MUNDO
A grande comunidade mexicana no EUA levou as tradições do Día de Los Muertos para diversos estados, como Texas, Arizona e Los Angeles.

Dia de los Ñatitas (Dia das Caveiras) é um festival celebrado na Bolívia em novembro. Nos tempos pré-colombianos, indígenas andinos tinham o costume de partilhar um dia com os ossos de seus antecessores no terceiro ano após o sepultamento (hoje somente as caveiras são usadas). Tradicionalmente, a caveira de um ou mais membros da família são mantidas em casa para tomar conta da família e protegê-la durante o ano. No dia 9 de novembro, a família coroa a caveira com flores frescas, às vezes também as vestindo com peças de roupa, e fazendo oferendas de cigarros, folhas de coca, álcool, e vários outros itens em agradecimento pela proteção durante o ano. As caveiras também são, por vezes, levadas ao cemitério para uma missa especial e bênçãos.

No Haiti, as tradições vudus se misturam aos sincretismos da celebração. Tambores e músicas retumbantes são tocadas por toda a noite pelos cemitérios para acordar o Baron Samedi, Senhor dos Mortos, e seu descendente, o Gede.

República Tcheca, Portugal e Espanha também celebram o Dia de Finados com oferendas, doces e brinquedos, porém, o mais comum na Europa é a visitação aos túmulos para a colocação de flores e velas com rezas. Em algumas comunidades germânicas e anglo-saxãs, comida é deixada na mesa de uma sala aquecida como um jantar para as almas.

Nas Filipinas o feriado Araw ng mga Patay (Dia dos Mortos) é uma reunião familiar, quando as tumbas são limpas ou repintadas, velas são acesas e flores são oferecidas. As famílias acampam por um ou dois dias nos cemitérios, realizando atividades comuns junto às tumbas de seus parentes.

Durante o Festival da Vaca (Gai Jatra) no Nepal, toda família que perdeu um membro durante o ano anterior deve fazer uma construção de bambus, panos e papéis decorativos com retratos dos falecidos, chamada gai. Dependendo dos costumes locais, uma vaca viva ou uma réplica são usadas durantes os rituais de celebração, uma vez que que, tradicionalmente, é esse animal que guia o espírito do morto no outro mundo.

Japoneses (Bon Odori), coreanos (Chuseok) e chineses (Ching Ming) também realizam festivais de limpeza das sepulturas e oferendas.

terça-feira, 17 de julho de 2018

Sila

Para os povos inuítes das regiões árticas da América do Norte, Sila, um espírito supremo poderosíssimo, é o governante do mundo. Dos seus domínios, muito acima da terra, ele governa as almas dos homens e dos animais e controla o mar e os elementos – o vento, a neve e a chuva – em torno dos quais a existência inuíte se desenvolve. Embora seja normalmente benéfico, Sila deve ser reverenciado e amansado com encantamentos e amuletos, já que uma ofensa ao deus pode resultar em condições climáticas extremamente perigosas. Apesar dos grandes poderes de que dispõe, Sila permanece como um espírito do ar, sem forma física.

sexta-feira, 1 de junho de 2018

Festa Junina


Todo mês de junho, há uma data em que o dia e a noite têm a maior diferença de duração: o solstício. No Hemisfério Norte, é o mais longo dia de todo o ano, período da colheita na Europa e, até mais ou menos o século X, com os últimos pagãos se convertendo, as populações dos campos comemoravam a data e faziam sacrifícios para afastar demônios e pragas. Como a agricultura é associada à fertilidade, cada região celebrava seu casal de deuses específico: no Egito, os votos eram para Ísis e Osíris; na Grécia, havia a festa de Cronus, o patrono da agricultura, ou, apenas para as mulheres, Adônis e Afrodite, quando elas faziam plantações rituais e caíam na farra; outro relembrado era Prometeu, o criador da humanidade que trouxe o fogo.

A Igreja Católica considerava essas festas como meros rituais pagãos, então, resolveu adaptá-las. No século XIII, três santos passaram a ser homenageados no mês de junho: Santo Antônio (dia 13), São João Batista (dia 24) e São Pedro (dia 29). Como ninguém sabe quando João Batista nasceu realmente, foi escolhido o dia 24 pela conveniência de sobrescrever os rituais pagãos mais próximos do solstício, e veio a calhar de ser exatos seis meses antes do Natal. São João passou a ser celebrado com fogueiras em quase todo o mundo cristão e as festas juninas nasceram.

Três séculos depois, já nos anos 1500, os portugueses chegaram ao Brasil e, junto com eles, suas tradições (o primeiro registro de festa comemorativa a São João data de 1583, em São Paulo, feito pelo jesuíta Fernão Cardim). As comemorações por aqui também foram adaptadas porque junho é inverno e exatamente o oposto: o dia do solstício é o mais curto do ano. As roupas de caipira são representações de agricultores, de pessoas que vivem da terra. O milho, muito utilizado pelos indígenas, tinha sua época de colheita em junho e, assim, se tornou a base do cardápio das festas. No século XIX, os imigrantes trouxeram outras especialidades para o clima frio como, os tradicionais vinho quente, pinhão e espetos de churrasco, “exportados” para o Norte do país.